São Paulo, sábado, 29 de abril de 1995
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Brasileiro acusa governo francês de prisão sem provas

ANDRÉ FONTENELLE
ENVIADO ESPECIAL A ROUEN (FRANÇA)

Um brasileiro afirma que foi condenado a seis anos de prisão na França sem provas. Ele foi acusado de tráfico de drogas. A diplomacia brasileira teria feito pouco para ajudá-lo.
Adicerlau Adelino Pacífico, 38, foi preso em Rouen (norte da França) em novembro de 1993, junto com M., 38, outro brasileiro, que não quer ser identificado.
Os dois eram tripulantes do cargueiro "Intrépido", da empresa carioca Transroll. A polícia francesa encontrou 74.112 kg de cocaína em tubulações do navio.
Foi a maior apreensão da história do porto de Rouen: a droga valia cerca de US$ 7,6 milhões.
Pacífico, no entanto, clama inocência. Ele, que era o enfermeiro do navio, se diz vítima de preconceito, por ser negro -o único do navio- e estrangeiro.
No último dia 7, M. e Pacífico foram condenados a seis anos de prisão. M., que temia pegar até 15 anos de prisão, ficou satisfeito com a pena. Pacífico recorreu.
Sua condenação se baseia em indícios frágeis, que são:
1 - Foi encontrada no bolso de Pacífico uma folha de papel, com a inicial "P" e o final de um número, "64". Seria o telefone de Paulo, o traficante que contactou M. Pacífico afirma que era o número de uma pessoa que ele conhecera em Salvador, durante uma escala do cargueiro.
2 - Pacífico disse à polícia, em um depoimento, ter visto M. escrever em uma agenda um número de telefone que terminava em "64". Isso provaria que os dois o conheciam o intermediário Paulo.
3 - Pacífico declarou que ouvira falar em um homem chamado Paulo, que traficava drogas para a Europa. A Justiça francesa considerou que se trata do mesmo Paulo que fez negócio com M.
Tradução
Pacífico contesta a tradução de seus depoimentos. Parte foi feita por uma tradutora juramentada, que fala o português de Portugal e, segundo ele, ela entendia mal a sua gíria carioca.
Outra parte foi traduzida pelo próprio comandante do navio -que traduzia para o inglês. Um tradutor juramentado de inglês vertia as frases para o francês. Na prisão, Pacífico diz que contou com pouca ajuda.
À exceção de uma francesa, que resolveu problemas jurídicos, e de um professor brasileiro que trabalhou como intérprete -sem ter sido pago-, seu caso despertou pouca atenção.
Segundo ele, a assistência do consulado do Brasil em Paris se limitou a auxiliar Pacífico a provar seus rendimentos no Brasil e a encaminhar parte do correio.
Não teria providenciado intérpretes nem ofereceu assistência jurídica.
Rio
Pacífico sonha em voltar ao seu apartamento na zona oeste do Rio, onde morava com a mulher Cláudia Feitoza (leia texto abaixo).
Pacífico, assim como M., já cumpriu um ano e meio de pena, devido à prisão preventiva.
Caso a pena dos dois seja mantida, eles podem sair dentro de mais um ano e meio, por bom comportamento.

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