São Paulo, domingo, 30 de abril de 1995
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Balanço da Cesp omite dados para acionista

FERNANDO RODRIGUES
DA REPORTAGEM LOCAL

O balanço anual da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), publicado no dia 19 de abril, omite fatos positivos da administração da empresa no ano de 94.
A atual diretoria também faz uma ressalva, no final do balanço, e sugere terem havido "atos ilícitos" na administração anterior da empresa estatal paulista.
A razão básica que gerou esses dois atos foi a guerra aberta que existe entre o atual governador paulista, Mário Covas (PSDB), e seu antecessor, Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB).
"Eles agradeciam o governador Fleury e nós não temos nada que agradecer ao Fleury", diz o diretor financeiro da Cesp, Emmanuel Sobral ao admitir e justificar a omissão de parte do relatório da administração no balanço da empresa referente a 94.
"Eles", no caso, é uma referência à diretoria anterior da Cesp, durante o governo Fleury. Na realidade, a única menção a Fleury estava no antepenúltimo parágrafo do balanço preparado pela diretoria anterior.
Uma praxe em documentos dessa natureza, os diretores agradeciam, entre outros, a acionistas e clientes, e, também, ao ex-governador do Estado. No final, ninguém recebeu agradecimentos.
A Folha teve acesso ao balanço preparado pela diretoria anterior da Cesp. O relatório da administração continha 195 linhas. No documento publicado dia 19 último, sumiram 75 linhas .
Essas 75 linhas eliminadas descreviam "fatos relevantes" da Cesp em 94. A expressão é um jargão do mercado de ações para descrever os atos administrativos da empresa que podem ter relevância no futuro da companhia.
Os fatos relevantes são um dos instrumentos que orientam investidores no mercado de ações. Um pouco com base nisso, deposita-se -ou não- confiança na empresa.
"O pessoal da diretoria atual da Cesp tem interesse em depreciar o valor da empresa. Querem manter o discurso de atacar a administração Fleury. E acabam prejudicando a imagem da Cesp", diz Antônio Carlos Bonini, presidente da empresa até dezembro passado. No balanço publicado da Cesp não foram incluídas informações sobre ações judiciais impetradas pela empresa contra o governo federal. Também sumiram indicadores técnicos e operacionais.
"Eles falavam sobre a entrada em operação comercial de cinco unidades geradoras, mas não diziam o quanto isso compromete financeiramente a empresa", justifica-se Sobral.
"Atos ilícitos"
No final do balanço está a assinatura dos integrantes da atual diretoria da Cesp. Embora eles não estivessem à frente da empresa no período ao qual o balanço se refere. Angelo Andrea Matarazzo, presidente da Cesp, disse à Folha que "isso é o normal". Mas não foi isso que lhe recomendou um dos advogados contratados pela estatal para analisar a questão.
"Entendemos que trata-se de obrigação dos administradores anteriores firmarem o balanço correspondente ao exercício sob sua gestão", diz o advogado Modesto Carvalhosa em um comunicado por escrito a Andrea Matarazzo.
A Folha obteve cópia do despacho de Carvalhosa. "Por uma questão ética, sou advogado da Cesp, não posso comentar o assunto", disse o advogado.
Carvalhosa havia sido consulta do sobre a presença de uma ressalva no final do balanço. E respondeu: "O fato de os novos administradores firmarem o balanço com a ressalva 'sem responsabilidade sobre os números constantes das demonstrações financeiras' constitui ato irregular de gestão."
Matarazzo recuou. No final do balanço acabou fazendo uma ressalva velada, com o mesmo efeito da anterior. Invocou o artigo 158 da Lei 6.404 de 1976.
Esse artigo diz que um administrador não é responsável "por atos ilícitos de outros administradores, salvo se com eles for conivente".
Como a lei já diz isso, não há problema algum em citar o artigo no final de um balanço. Mas, ao fazer questão de fazer a menção, a diretoria atual da Cesp levanta uma dúvida sobre a probidade da administração anterior.
Para o advogado Fábio Konder Comparato, o balanço da Cesp está "tecnicamente errado" por causa da assinatura dos diretores atuais. Sobre a ressalva final, afirma que "é uma maneira de eles (a diretoria) dizerem que não tem nada a ver com isso".

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