São Paulo, domingo, 30 de abril de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Precisão do mapeamento feito por satélites substitui bravura de primeiras expedições Rondon e Roosevelt mapearam a região em 1914 RICARDO BONALUME NETO
Os primeiros visitantes não tinham porém um interesse propriamente científico. Se aventurar por rios, montanhas ou desertos desconhecidos por mera curiosidade se tornou moda apenas no século 19. Antes disso, o rio das Amazonas (leia texto ao lado) era visitado por interesses mais pragmáticos. Os primeiros europeus que navegaram pelo Amazonas não queriam mapear o rio em detalhe, embora certamente estivessem preocupados com o seu tamanho. A expedição do espanhol Francisco de Orellana foi a primeira a descer o rio e estava basicamente interessada em sobreviver. Orellana tinha saído de Quito em 1541 no grupo de Gonzalo Pizarro, irmão do Francisco Pizarro que conquistou o Peru aos incas. Depois do saque ao império inca havia uma certa falta do que fazer entre os conquistadores, e essa era uma das expedições que buscava aproveitar essa mão-de-obra especializada e ociosa em novas empreitadas. Em certo momento Orellana foi mandado à frente da expedição em busca de comida, mas em vez de voltar terminou continuando Amazonas abaixo até o Atlântico. Pizarro, esperando semanas em vão pelo colega, voltou a Quito. O mito das mulheres guerreiras alimentado pelas descrições do cronista da viagem, frei Gaspar de Carvajal, juntou-se a outros mitos sobre a região, como os da rica região de El Dorado ou dos homens sem cabeça descritos pelo inglês Sir Walter Raleigh nas Guianas. Indignados com a presença espanhola no território amazônico, os portugueses resolveram agir -quase um século depois da viagem de Orellana-, e em 1637 saiu de Belém a expedição de Pedro Teixeira. Foi a primeira a fazer a viagem de subida do rio, e dessa vez foram os espanhóis que levaram o susto, quando oito meses depois ele chegava em Quito. Nessa época Portugal ainda era ligado à Espanha -mas a união das coroas ibéricas acabou em 1640. A viagem de volta de Teixeira teve outro cronista, o jesuíta espanhol Cristobal de Acuña, que mais uma vez alimentou a lenda das mulheres guerreiras. Esse viajar todo foi aos poucos criando o conhecimento sobre o rio. Teixeira já estava em uma expedição prática, buscando mapear o novo domínio. Poucos anos depois chega à região a épica bandeira de Raposo Tavares. A maior parte do maior rio do planeta estava se tornando luso-brasileira. Os exploradores levavam como instrumentos básicos de trabalho a cruz ou a espada, o que não impediu que o jesuíta alemão Samuel Fritz fizesse um bom trabalho de cartografia no final do século 17. Entre as ordens religiosas, os jesuítas eram os melhores exploradores. A exploração propriamente científica do rio começou só com o francês Charles Marie de La Condamine, que esteve na região amazônica de 1735 a 1743. O objetivo inicial era ciência pura: checar a idéia de Isaac Newton de que o mundo não era uma esfera pefeita, mas mais larga no Equador e chata nos pólos. A expedição acabou não servindo para ajudar a responder à questão -uma expedição polar decidiu que Newton estava certo antes de Condamine e seu pessoal voltarem à Europa. Mas apesar de algumas desgraças, como a morte de vários participantes, a expedição coletou dados importantes sobre fauna, flora e etnografia -como era o costume das expedições multidisciplinares de então. A lenta chegada da ciência moderna ao Brasil luso teve uma brilhante exceção com a expedição de Alexandre Rodrigues Ferreira no final do século 18. Durante nove anos ele explorou a região, mas o resultado de suas pesquisas demorou a ser divulgado. Os espécimes e desenhos estavam em Lisboa quando os franceses tomaram o país e acabaram saqueados pelo colega Geoffroy Saint-Hilaire. O século 19 viu uma enxurrada de naturalistas visitarem a região. O barão alemão Alexander von Humboldt, por exemplo, mostrou qual era a conexão entre os rios Orinoco e Amazonas. A lista de naturalistas europeus começa a ficar longa: Henry Walter Bates, Alfred Russel Wallace, a dupla Johann Baptist von Spix e Karl Fridrich von Martius, Auguste de Saint-Hilaire etc. Junto aos cientistas veio também a exploração econômica de produtos como a borracha e a cinchona (árvore de onde se extrai o antimalárico quinino), e o furto de sementes e mudas dessas árvores por britânicos -o tipo de debate que ainda não se encerrou, pois a biodiversidade das florestas tropicais pode esconder outros produtos úteis. Descobrir rios foi algo feito também pela expedição do ex-presidente americano Theodore Roosevelt e do então coronel brasileiro Cândido Mariano Rondon. O brasileiro achou um rio que batizou rio da Dúvida. Ele e o ex-presidente mapearam 1.525 km na expedição em 1914. Hoje ele se chama rio Roosevelt. Texto Anterior: Professores ignoram extensão Próximo Texto: Explorações navegam em mitos Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |