São Paulo, domingo, 30 de abril de 1995
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ONU tenta combater "lavagem" anual de US$ 750 bilhões pelo narcotráfico

CLAUDIO JULIO TOGNOLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um fantasma ronda o mundo, ameaça governos e desperta a reação de representantes de 180 países reunidos até 10 de maio no Cairo, Egito: está materializado em US$ 750 bilhões, que são "lavados' anualmente a partir dos lucros gerados com o tráfico internacional de drogas e atividades do crime organizado.
A quantia é o triplo do PIB (Produto Interno Bruto) argentino -a quantidade de riquezas geradas pelo país em um ano.
O 9º Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção ao Crime Organizado, iniciado ontem, discute mecanismos capazes de bloquear a "lavagem", ou seja, a conversão de dinheiro ilegal em bens ou capitais legalizados.
"O sistema bancário de qualquer país pode ser vítima, hoje em dia, da atuação das máfias", diz à Folha o oficial Omar Alemán, da Drug Enforcement Administration (DEA), da Flórida, organismo norte-americano responsável pelo combate ao narcotráfico.
Só o governo dos EUA gastou no ano de 1994 US$ 67 bilhões em atividades ligadas ao combate ao tráfico, prevenção às drogas e tratamento de dependentes.
A reunião do Cairo dá prosseguimento ao encontro de novembro passado, em Nápoles (sul da Itália), quando representantes de 140 países discutiram o crescimento das máfias em todo o planeta.
É a primeira vez, em sua história, que as Nações Unidas convocam, em menos de cinco meses, um encontro de cúpula para tratar de um mesmo assunto. Deverá ser anunciada nos próximos dias a criação de uma "Liga Mundial Anti-Máfia".
Os números divulgados no Cairo são expressivos: segundo o Departamento de Estatísticas Financeiras do Fundo Monetário Internacional (FMI), a cada ano cresce em US$ 100 bilhões o faturamento de máfias enraizadas em 23 países.
A soma é gerada sobretudo a partir do tráfico de cocaína dos cartéis colombianos -que faturam, anualmente, entre US$ 100 e US$ 200 bilhões.
Neste meganegócio internacional o Brasil é apontado como o principal entreposto utilizado pelos cartéis para escoar a droga -num esquema de "globalização mafiosa que chega até a Rússia".
Com a queda do império soviético, a Rússia é hoje uma vedete do crime. É ponto de conversão das maiores máfias mundiais e, segundo o FBI (a polícia federal dos EUA), as atividades do crime organizado têm gerado uma evasão anual de US$ 3,3 bilhões em território russo.
As operações do narcotráfico com os grupos do crime organizado russo envolvem trocas de drogas com material radiativo que pode ser usado para a produção de armas atômicas.
Liga mundial
No final do encontro do Cairo deverão ser assinados convênios internacionais de troca de informações sobre as máfias e novos tratados de quebra de sigilo bancário e extradição de acusados.
Os acordos firmados em Nápoles e no Cairo indicam que o crime organizado e o tráfico internacional de drogas vão ocupando o lugar de "inimigo público número um" das democracias.
"Foi trocada, neste fim de século, a imagem do inimigo dos poderes públicos", diz à Folha o oficial Antonio Borrelli, que comanda a Squadra Mobile de Nápoles, departamento encarregado de combater a máfia no sul da Itália.
Segundo Borrelli, os narcotraficantes internacionais chegarão ao ano 2000 ocupando o lugar que, no anos 50 e 60, era preenchido pelos comunistas -e, na década de 70, pelos terroristas. "Os traficantes serão o alvo número um da Liga Mundial Anti-Máfia", diz.

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