São Paulo, terça-feira, 2 de maio de 1995
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País dividido

O Brasil está dividido em duas partes desiguais. Existe uma pequena parcela que consome produtos requintados, dispõe dos melhores serviços e, na medida do possível, se protege contra a violência.
Do outro lado está a grande maioria da população. Alimenta-se mal, tem de recorrer aos precaríssimos sistemas públicos de saúde e educação e, diante da ineficiência dos aparatos de segurança, vive sob constante ameaça.
Esse perverso processo de marginalização da maioria dos brasileiros tem origem na virtual falência do Estado, que é, a um só tempo, grande demais e pequeno demais. Grande porque administra desde sistemas universais de educação e saúde até a geração de energia, passando pela gestão de diversas fábricas que nada têm a ver com o setor público propriamente dito.
E, nesse gigantismo, o Estado como que se aniquilou. Ao fazer tudo, passou a não fazer nada direito. Assim, saúde, educação e a própria polícia entraram em colapso.
Quem pôde, quem tinha dinheiro, como que fugiu do Estado. As classes abastadas não usam os hospitais públicos; têm planos de saúde que lhes proporcionam um atendimento em muitas áreas comparável aos dos grandes centros mundiais. Seus filhos não vão a escolas públicas; frequentam excelentes e caros estabelecimentos privados. Pouco esperam da polícia; previnem-se contratando empresas de segurança e seguradoras.
Como mostrou reportagem publicada na edição de ontem desta Folha, a indústria da violência consome cerca de US$ 28 bilhões ao ano, 6,4% do PIB nacional. Os cálculos, feitos pelo economista Ib Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas, incluem os gastos com empresas de vigilância, seguros, equipamentos de segurança e pagamento de resgates e extorsões.
Há um outro dado inquietante. Entre 93 e 94, o setor de seguros cresceu 63%, contra os 5,7% do PIB. É claro que existe uma distorção nesse processo.
Ou o Estado brasileiro se concentra apenas nas áreas em que de fato deve atuar (saúde, educação, segurança) e passa a proporcionar serviços minimamente dignos aos cidadãos, ou a separação entre os dois Brasis, o apartheid social, vai-se aprofundar ainda mais. Sabe-se lá com quais consequências.

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