São Paulo, sábado, 6 de maio de 1995
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A falta que um Goebbels faz

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - A primeira palavra -e única- que aprendi em alemão foi ``propaganda". Até hoje, quando vejo filmes sobre o nazismo, com Hitler e Goebbels aos berros, fico lisongeado quando a distingo no meio de uma selva de sons ásperos e obscuros. Por fração de segundo tenho a impressão de que dali por diante entenderei o resto.
Propaganda foi ação-chave do nazismo. Não havia, então, o conceito da comunicação, embora já existisse a palavra. Feitas as contas, tanto a comunicação como o marketing, guardadas as especificações de cada ramo, nascem e desembocam na propaganda -peça de sustentação de regimes messiânicos ou candidatos a isso.
A viagem presidencial aos EUA nada mais foi que um episódio de propaganda -os gênios da publicidade ficam arrepiados quando ouvem essa palavra, preferem publicidade, marketing, soa moderno, neoliberal, globalizado.
Não respeitaram sequer a memória do Tom Jobim, promovendo-lhe um tributo custeado pela sacola que por aqui passou, entre empresários e interessados, no melhor estilo da sacola do PC Farias.
Um presidente que tivesse o senso do ridículo teria evitado aquela concentração de brasileiros que se juntaram como turistas que chegam a Paris e logo perguntam onde podem comer uma boa feijoada. Do presidente ao papagaio de pirata mais descarado, todos estavam de olho no mercado interno.
Os mais espertos devem ter percebido o ridículo, mas a propaganda tem sempre um lado ridículo. O sujeito abre a porta do carrão e garante que não vai para o trabalho sem antes usar determinado creme de barba. Subentende-se que o carrão do sujeito é devido ao creme de barba que ele usa. Subentende-se que o mundo parou e se curvou diante do Brasil.
O governo acha que o povo está contra as reformas por falta de comunicação. Flexibilizaram o monopólio do gás encanado -e muita gente nem sabia da existência desse maléfico monopólio. O dr. Goebbels está fazendo falta.

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