São Paulo, domingo, 7 de maio de 1995
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Arrocho mantém maioria fora do mercado

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Além de provocar recordes históricos no calote do crediário, a guerra do governo contra o consumo adiará um pouco mais a entrada de parte dos quase 90 milhões de brasileiros que hoje estão praticamente à margem do mercado.
A idéia fixa do Banco Central contra uma economia aquecida tem dois objetivos: segurar os preços para o caso de a indústria não ter fôlego para atender o consumo e diminuir as importações.
Entre os empresários, criou-se um consenso diferente. ``É o momento de colocar a economia em outro patamar. Os novos consumidores do real devem ser incorporados ao mercado, não alijados mais uma vez", diz o empresário Bóris Tabacof, diretor do Departamento de Economia da Fiesp.
Há uma razão fundamental para tal afirmação.
Nos seis primeiros meses do real (entre julho e dezembro de 94), as empresas tiveram lucros de US$ 14,8 bilhões obtidos exclusivamente nas vendas. O ganho foi suficiente para compensar prejuízos de US$ 5 bilhões do primeiro semestre e para que fechassem o ano com lucro de US$ 9,8 bilhões.
Já o lucro financeiro encolheu US$ 600 milhões no mesmo período. Fechou o ano de 94 em US$ 5 bilhões.
Os dados foram tirados pela consultoria Austin Asis dos balanços de 330 companhias com ações nas Bolsas.
Os números mostram que a lógica empresarial mudou com o real: agora, é a produção e o consumo que geram os lucros.
Para a Fiesp e as principais redes de lojas, em nenhum momento do real existiu ameaça de desabastecimento -salvo raras exceções.
Mas entre julho de 1994 e março deste ano o país importou US$ 11,6 bilhões mais do que em igual período do ano anterior. Nos nove meses, a balança comercial foi positiva em apenas US$ 1,1 bilhão.
Investindo US$ 60 milhões este ano, o presidente da Sadia, Luiz Fernando Furlan, diz que a ``agonia" do vaivém com o consumo é que ele causa ``insegurança" para investir. ``E sem investimento não há emprego ou renda; sem renda e emprego não há mercado; e sem mercado não há investimento. É um ciclo vicioso".
Líder em vários segmentos da área de alimentos, a Sadia vende para menos da metade da população do país e poderia, de imediato, aumentar sua produção em 10% caso tivesse mais mercado.
Na média, segundo a Fiesp, as empresas paulistas poderiam crescer a produção a curto e médio prazos em até 19%. ``Com os investimentos dos últimos três anos, a indústria está pronta para um mercado maior", diz Tabacof.
Ele cita o caso do setor automobilístico. Com os ``populares", as montadoras aumentaram a produção em mais de 30% em dois anos.
Na semana passada, com vendas plenas e com os importados contidos, o setor pressionou o governo e conseguiu aumentar seus preços em 7,5%.
O economista Heron do Carmo, coordenador-adjunto da Fipe, que calcula a inflação em São Paulo, concorda que a economia não pode acelerar muito. A inflação subiria e pressionaria as importações.
A atividade industrial no primeiro trimestre deste ano está 21% maior do que a do primeiro trimestre de 1994 -especialmente por que na época o quadro era de desaquecimento. Na comparação com o último trimestre de 94 (com o real já em vigor), a atividade industrial é apenas 3,2% maior.
Nelson Veiga, diretor da rede de supermercados Paes Mendonça, com 39 lojas no país, diz não encontrar nenhuma dificuldade na indústria em atender a um consumo até 10% maior do que o atual.
``Existem apenas problemas pontuais com o setor de embalagens", diz Veiga. ``É pouco para que o governo viva estancando as classes produtoras".

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