São Paulo, domingo, 7 de maio de 1995
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Porteiro divide sua TV com 8 pessoas

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-metalúrgico e atual porteiro Geraldo Correia Lima, 46, comprou sua única televisão há quase dez anos, quando era funcionário da Cobrasma.
Lima -original de Icó, no Ceará- divide hoje o aparelho com oito pessoas na pensão onde mora no centro de São Paulo.
São todos porteiros, ajudantes de cozinha e garçons que, como ele, ganham menos de três salários mínimos por mês.
Na pensão, cerca de 50 pessoas dividem 20 quartos. Poucas têm TVs, geladeiras ou fogões.
Lima e seus colegas fazem parte dos 43 milhões de brasileiros maiores de 10 anos de idade que trabalham e vivem com menos de R$ 300 por mês. Outros 46 milhões, segundo o IBGE, não têm qualquer rendimento.
``A grande maioria dos brasileiros só consome o que já passamos a chamar de essencialíssimo. É o arroz, o feijão, óleo, açúcar e macarrão. Não sai disso", diz Nelson Veiga, diretor da rede de 39 hipermercados Paes Mendonça.
``O ovo, a carne, frutas e verduras vão para uma minoria. Sem falar nos eletrodomésticos", diz.
Um exemplo: no ano passado, a indústria brasileira produziu 5,6 milhões de televisores. Isso representa quase 20% do total de residências que têm TV no país. O problema é que o consumo está concentrado em quem ganha mais.
A agente de turismo Vera Amaral é um caso típico. Tem marido e três filhos e sete aparelhos de TV (dois comprados em 94), dois vídeos e duas geladeiras. Na pirâmide social, Vera figura entre os 2,2 milhões de pessoas que ganham mais de R$ 2.000,00 por mês.
A indústria de automóveis é outro caso. Produziu e vendeu quase 1,6 milhão de carros em 94. Mas o Brasil tem apenas um veículo para cada 12 habitantes -menos que a Polônia, Argentina ou México- e uma frota com idade média entre as mais velhas do mundo (11 anos e dois meses).
A rede de lojas Mappin estima que apenas 18% de seus consumidores pertencem aos que ganham menos no país. É nesta fatia que estão concentrados os usuários do crediário (em até 12 meses), segundo o diretor Sérgio Orciuolo.
É também entre estes consumidores que o calote (inadimplência) explodiu nos últimos meses como reflexo das medidas -juros mais altos- que o governo tem tomado para conter o consumo.
(FCz)

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