São Paulo, quarta-feira, 10 de maio de 1995
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A teoria e a prática econômica

LUÍS NASSIF

Se, no fragor da batalha, o general ordena que os soldados avancem, e eles entendem que devem recuar, o resultado final é o recuo -e a corte marcial para o general.
Na política econômica ocorre o mesmo -com exceção da punição ao general. O resultado final de determinada política é a soma das reações que provoca nos agentes econômicos. E a reação dos agentes não é padronizada nem homogênea. Depende de circunstâncias, da comunicação e da credibilidade do governo, entre outras coisas.
Teoria econômica aprende-se na escola e ajuda a conhecer, no plano teórico, os instrumentos de intervenção na atividade real. Conhecimento das reações que as medidas suscitam nas empresas. Depende da prática e da capacidade de observação da realidade.
Falta uma perna no conhecimento dos economistas que conduzem a política econômica.
O Brasil virou refém de dois erros cometidos por eles.
No ano passado, consultaram o manual, fizeram algumas contas e concluíram que, com 15% de defasagem no câmbio, conseguiriam reduzir o superávit comercial para US$ 5 bilhões/ano. Há quatro meses o país convive com déficits comerciais acima de US$ 1 bilhão -que nada têm a ver com a crise mexicana.
Constatado o erro, tentaram mudar o câmbio. Operaram mal e produziram novo desastre de proporções consideráveis.
Para não dar o braço a torcer, evitam convocar operadores eficientes para uma nova tentativa de reajustar o câmbio. O medo de um novo desastre operacional impede-os de agir na área. A saída encontrada foi recorrer a essa política maluca de juros que, a pretexto de reduzir as importações, vai jogar o país em uma grande recessão.

Sem responsabilidades
A lógica da contemplação é simples. Erros na política cambial têm responsáveis, com nome e RG. Nas recessões profundas, as responsabilidades são mais diluídas. Além disso, julga-se que a mudança no câmbio provocaria a volta da inflação; a recessão, não. E aí entra-se na questão do conhecimento prático da psicologia das empresas.
Não ocorreu a nenhum deles indagar-se por que, nos últimos meses, o superaquecimento da atividade econômica não gerou inflação. Simplesmente porque as empresas conseguiram absorver aumentos de custos (como a manutenção dos reajustes salariais) com ganhos de escala.
Com o processo recessivo, sem alternativas de créditos bancários, a saída das empresas será aumentar os preços, compensando no preço unitário o que perderam na escala.
O que essa política monetária maluca irá produzir são favas contadas. Num primeiro momento, o aprofundamento da recessão, o aumento da inadimplência e do desemprego. Num segundo, a volta da inflação, pelo aumento dos custos fixos (que terão que ser rateados por menos produção).
No decorrer do processo, novamente haverá a inviabilização das contas públicas federais e estaduais, pelo encarecimento estúpido da rolagem das dívidas.

Onisciência
Indagado sobre qual seria a reação do governo se as medidas monetárias jogassem o país na recessão, o ministro Pedro Malan respondeu: ``Corrigiremos a tempo, como sempre tem sido feito". Ele e seus companheiros receberam inúmeros avisos de que a política cambial estava errada. Só depois do desastre consumado é que resolveram agir.

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