São Paulo, quinta-feira, 11 de maio de 1995
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A modernidade do passado

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - O Brasil é campeão em matéria de sonegação fiscal. Tanto na oposição como no governo, todos sabem que os grandes negócios não pagam imposto. A partir de certa faixa na classe média, há centenas de artifícios para burlar o fisco.
Compra-se uma fazenda modesta, coisa para amador, e na hora da escritura tem sempre um entendido que ensina o macete para que o Estado não receba o que lhe é devido.
O argumento moral que justifica esse tipo de roubo é simples: o Estado não é confiável, desperdiça o dinheiro recebido. Um aluno de Harvard, não faz muito, descobriu que quem paga ágio é otário. Quem paga imposto também é.
Querem ressuscitar o IPMF. Esse, pelo menos, pega todo mundo, embora já existam atalhos que diminuem a truculência desse imposto, sobretudo quando o valor dos cheques vai além de certo patamar.
Quando foi instituído, o IPMF serviria para cobrir déficits em certos setores. Não cobriu déficit algum. Aumentou apenas o bolo da receita. O descalabro na saúde, na educação e na segurança, só para ficar em três setores básicos da sociedade, é uma prova de que o governo Itamar, com seu iluminado ministro da Fazenda, não resolveu o problema, apesar dos recursos que obteve do Congresso.
Usou-se esse ``plus" fiscal, que deveria ser utilizado no campo social (e o nome ``social" batizou um desses recursos), para comprar goiabada -com a atenuante de que a goiabada comprada pelo fundo social foi de excelente qualidade.
O ministro Jatene, e agora o ministro Andrade, desejam o IPMF de volta, desde que gravado por essa destinação que, grosso modo, seria social.
É a lei do menor esforço, ampliada pela lei de Gerson.
O próprio presidente declara que, a cada dólar arrecadado pelo fisco, um dólar é sonegado. Nisso ninguém mexe. É a prática mais antiga do Estado brasileiro. Cuja modernidade, tão apregoada na mídia e no próprio governo, não se envergonha de apelar para um passado que deveria ser esquecido.

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