São Paulo, sexta-feira, 12 de maio de 1995
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Leitura na Fuvest

IZETI FRAGATA TORRALVO

Ler é algo essencial para quem participa de uma sociedade moderna, isto porque desde as atividades mais cotidianas, como consultar um anúncio classificado, solicitar um extrato bancário, até as mais sofisticadas expressões culturais, o homem moderno necessita de representações linguísticas. Esse é o discurso defendido nos meios acadêmicos e, portanto, nada há de surpreendente no fato de alguns vestibulares avaliarem a habilidade de ler e escrever dos candidatos.
Conferir, então, a capacidade de compreensão, de crítica e de interpretação de textos literários e não-literários tem sido o objetivo expresso do vestibular realizado pela Fuvest. Desenvolver essa capacidade é também o que fundamenta a elaboração dos cursos de língua portuguesa para os cursos de 1º e 2º graus.
Assim exposto, tem-se a sensação de que há uma relação harmoniosa entre os preceitos teóricos e a prática. Neste caso, triunfamos: a teoria na prática é a mesma! No entanto, sejamos claros -há graves problemas para a efetivação de tudo isso.
Ao divulgar a famosa ``lista de livros", a Fuvest aparentemente colabora com o trabalho de professores e alunos. Entretanto, tal lista mais desorienta do que norteia os cursos de 2º grau, pois para cumprir-se uma leitura cuidadosa de dez obras literárias são necessários tempo e planejamento apurado. Então, como um estudante pode se preparar bem, quando a sete meses da prova a Fuvest substitui metade dos livros indicados no ano anterior?
Além disso, não sejamos ingênuos: raramente um jovem é um bom leitor de textos literários; pois além desse tipo de leitura estar cada vez mais distante das tarefas diárias dos adolescentes, eles ainda precisam sedimentar, pela prática constante, a percepção sutil dos mecanismos que estruturam textos literários e habituar-se à reflexão cuidadosa que os grandes escritores exigem.
Esse descompasso entre as exigências da Fuvest e a realidade do 2º grau gera inclusive distorções sérias. É comum que o candidato, para vencer os desafios da leitura para o vestibular, recorra a artifícios, procure e siga rigorosamente dicas, leia resumos, comentários feitos por professores e distancie-se cada vez mais do exercício e do prazer da leitura integral das grandes obras, digerindo, de maneira superficial, a leitura de outros.
Não vai aqui nenhum tom de lamento, mas é urgente que os coordenadores da Fuvest se disponham a ouvir realmente os professores de 2º grau. É fundamental que se possa discutir não só o prazo das indicações, mas também o critério de seleção de textos.
Penso que, só assim, o colégio e a universidade podem contribuir de maneira mais eficaz para o desenvolvimento de uma leitura crítica própria dos estudantes pré-universitários.

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