São Paulo, sexta-feira, 12 de maio de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Desenvolvimento social e sustentação ambiental

ISRAEL KLABIN

Em recente reunião, encontrei-me com um dos ícones do empresariado brasileiro, dr. Augusto de Azevedo Antunes. Entre os mais importantes exemplos de dignidade que o Brasil tem tido, está a postura ética e a austeridade pessoal com que esse honrado brasileiro produziu a aura de respeito e admiração que o cerca.
Dizia-me ele de como seria fundamental que os pobres e desassistidos 30 milhões de brasileiros tivessem uma representação política formal. Por outro lado, observava que todos os partidos, tanto de esquerda quanto de centro, vêm falhando lamentavelmente nessa representação, por falta de projetos pragmáticos e de reflexo direto, tanto nas razões quanto nos efeitos da pobreza.
Penso eu que nada como uma pessoa de idade avançada e que convive com o seu próprio futuro para ter uma visão global dos destinos de sua comunidade. E quando essa pessoa é alguém da estatura moral de dr. Azevedo Antunes temos de escutá-lo e nos propor prioridades essenciais para nosso país.
Desenvolvimento social é, em última análise, o atendimento imediato de três propósitos fundamentais: 1) alimento para todos; 2) saúde para todos; 3) destino comum a todos. Toda uma série de conceitos básicos sobre os quais se consolidou o modelo econômico, político e social do passado estão em franca derrocada.
Um país com capacidade técnica, financeira e empresarial para produzir excessos gigantescos de alimentos; que os mantêm eventualmente estocados por falta de mecanismos para atingir o mercado; que trata o assunto da produção agrícola sob o aspecto exclusivamente econômico e que, ao mesmo tempo, mantém uma desordenada e desgovernada massa de 30 milhões de famintos, tem que forçosamente rever os seus conceitos éticos fundamentais, bem como avançar rapidamente para um modelo eficaz no qual comida pode ser ``commodity", mas é, acima de tudo, um direito básico e inalienável a todo ser humano.
Em países do Primeiro Mundo esse tipo de problema já não existe. Nos modelos liberais e social-democratas do planeta, os mecanismos de acesso dos menos favorecidos ao alimento básico necessário já têm os seus mecanismos de implementação e sistema de distribuição claramente definidos. É só imitá-los.
Assisti, ainda, um outro ilustre brasileiro, o professor Adib Jatene, ministro da Saúde, propondo ao Congresso Nacional a volta do imposto sobre cheques, cujo resultado seria destinado às necessidades da saúde pública do Brasil. O professor Jatene tem a confiança do país. A sua proposta, feita de forma pragmática, pode ser implementada rapidamente.
A sociedade, como um todo, tem a obrigação de dar a esse digno brasileiro os instrumentos que ele necessita para a política pública de saúde que é, assim como o alimento, um direito natural do cidadão neste fim de século e do ciclo histórico que se seguirá.
Esses dois pontos, alimento para todos e saúde para todos, são de crucial importância para o perfil do modelo de desenvolvimento sustentável que procuramos perseguir.
O ilustre presidente Fernando Henrique Cardoso, um dos mais preparados chefes de Estado que qualquer país do planeta pode aspirar a ter, está implementando da forma mais dinâmica possível as ferramentas necessárias para que a cidadania se faça representar na solução dos problemas sociais.
A empresa, os empresários, os movimentos de cidadania e as forças políticas da nação têm obrigação de estruturar e participar dos mecanismos de atendimento à população carente no que tange a seus direitos básicos e fundamentais de alimentação e saúde.
Idéias práticas e eficientes para essas propostas não faltam. O que se faz necessário é reeducar as elites brasileiras no que se refere às verdadeiras prioridades do país. Algumas já foram alcançadas, tais como a estabilização monetária. Outras ainda estão muito longe e necessitam para sua consolidação de uma elite ética, eficiente, com visão do futuro e empenhada não em assistencialismos, mas em projetos eficientes e pragmáticos que venham a resolver os gargalos da sociedade em que vivemos, de forma permanente, institucionalizada e cumprindo o mandamento superior. Comida não é favor. Comida é um direito.
Nasci, cresci e trabalhei toda a minha vida lidando e aprendendo com a natureza. A árvore é, para mim, não apenas um ser vivo que me complementa me dando os seus frutos e sendo por mim usada como matéria-prima, porém, mais do que isso, produziu em mim o senso de que cada um de nós é parte complementar da natureza que nos cerca. Aprendi do professor José Lutzenberger a idéia básica de Gaia, pela qual a interdependência entre todo ser vivo e com toda a natureza, faz do planeta um organismo solidário, co-responsável e no qual o desequilíbrio de uma das formas de vida, seja pela destruição da natureza ou do próprio homem, provocará, sem dúvida, a destruição de todos nós.
O que a terra produz é fruto do trabalho do homem, porém, acima de tudo, é obra do Criador. A quem pertence a terra? Pelo que eu entendo, nós é que pertencemos a ela. Isto, em última análise, é desenvolvimento sustentável. A ética social é o parâmetro da eficiência de qualquer modelo econômico. O lucro é apenas uma ferramenta para a feitura de um desenvolvimento sustentável e socialmente homogêneo.

Texto Anterior: GREVE NO METRÔ; CASUALIDADE; BRASÍLIA
Próximo Texto: Limitações ao direito de greve
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.