São Paulo, sábado, 13 de maio de 1995
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Cantora teme concorrência dos homens

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

Contraltos são espécimes em extinção e tendem a ser substituídas por homens nos palcos e gravações. Quem aponta o fenômeno é a contralto francesa Nathalie Stutzmann, 29, a grande (e única) diva atual do gênero.
Nathalie tem três dos seus 15 CDs solos editados no Brasil. Numa carreira de apenas sete anos, coleciona prêmios e é tida como estrela nos palcos e nos estúdios.
Seu temor maior são os contratenores. Ouviu e detesta a trilha do filme ``Farinelli", sobre o castrado divo da ópera do século 18. Não é para menos. Com a moda da música histórica, a ``prima donna" sofre concorrência do ``primo uomo", com voz mais forte.
Nathalie falou à Folha anteontem, por telefone, de Paris, onde se prepara para uma maratona que cruzará o século.
Folha - As contraltos vivem um drama difícil hoje em dia, não?
Nathalie Stutzmann - Sim. Hoje há quatro contraltos em atividade. A tendência biológica da humanidade é gerar mulheres com voz de soprano e homens barítonos.
Folha - E a humanidade tem produzido cada vez mais homens de voz aguda...
Stutzmann - É verdade, ah! ah! ah! Mas, para falar a verdade, não acho tanta graça assim porque os contraltos e sopranistas masculinos estão tomando nosso lugar. A ópera romântica tem poucos papéis para contralto. Restam-nos as barrocas e ali temos que nos engalfinhar com os divos.
Folha - Você viu ``Farinelli"?
Nathalie - Não, mas ouvi a trilha. Detestei. A mistura de voz feminina e masculina é falsa. É mais circo do que uma contribuição. Uma contralto mulher pode cantar Haendel com mais talento do que um homem. Mas, nessa área, prefiro homem a uma meio-soprano.
Folha - Sua formação inclui o fagote e o piano. Você os toca?
Nathalie - Toco fagote por diversão. Piano eu uso para ensaiar. Os instrumentos servem para complementar minha formação vocal. A voz é o mais básico dos instrumentos. Meus pais são cantores e, sobretudo minha mãe (a soprano Christiane Stutzmann), me ensinaram tudo o que sei. Minha mãe cantou no Rio nos anos 60.
Folha - Por que você ainda não veio ao Brasil?
Nathalie - Não é por falta de vontade. Nunca recebi proposta.
Folha - Você pode se definir?
Nathalie - A voz é uma forma de fornecer fantasias para as pessoas comuns. Gosto de cantar com alma. Não faço contemporâneos porque eles não têm coração.
Folha - Planos?
Nathalie - Preparo CDs com uma ópera de Haendel, as canções de Chausson e Brahms e a conclusão dos lieder de Schumann. Participo das óperas ``Pelléas et Melissande" (Bruxelas, 1996), ``Ombra Felice" (Sazlburgo e Paris, 1997) e ``Orfeo" (Amsterdã, 1998).
Folha - Você tem tempo para a vida particularl?
Nathalie - Dou um jeito. Não sou e nem posso ser casada. Mas sempre encontro tempo para amar.

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