São Paulo, sábado, 13 de maio de 1995
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Dez razões para acabar com a embromação

JAIME WRIGHT

O governo brasileiro deve reconhecer a lista de desaparecidos pelos seguintes dez motivos:
1) Porque o projeto ``Brasil: Nunca Mais", baseado nos próprios registros do regime militar, comprova que os presos políticos desapareceram após serem detidos pelos órgãos repressores;
2) Porque a mesma tecnocracia que preservou os processos políticos nos arquivos do Superior Tribunal Militar (STM) terá preservado, nos mínimos detalhes, os informes sobre o destino final dos presos políticos desaparecidos -fato confirmado pelo depoimento do ex-membro do Centro de Informações do Exército (CIE), Marival Chaves Dias do Canto;
3) Porque, pelo artigo 120 da 3ª Convenção de Genebra, assinada pelo Brasil em 12/8/49, ``as autoridades detentoras de prisioneiros deverão assegurar que os túmulos dos que morreram em seu poder sejam respeitados, mantidos e marcados adequadamente, para que possam ser encontrados a qualquer tempo";
4) Porque uma variedade de situações jurídicas constrangedoras nas famílias de presos políticos desaparecidos só podem ser resolvidos pelo reconhecimento da morte do desaparecido, seja por um atestado de óbito ou por uma declaração oficial de ausência;
5) Porque ajudará a resgatar a imagem das Forças Armadas, ainda comprometida pela institucionalização da tortura durante a recente ditadura;
6) porque um ``mea culpa" público será eticamente correto, com aclamação internacional, e essencial para a consolidação do nosso regime democrático;
7) Porque a revelação das circunstâncias em que as prisões e mortes se operaram contribuirá para que não permaneça fragmentada a história das vidas dos desaparecidos;
8) Porque a localização dos filhos, irmãos, pais e esposos servirá para dar-lhes sepultura digna, em uma atitude de respeito aos vivos, a quem assiste o direito de velar seus mortos;
9) Porque acabará com a vergonhosa tática de embromação utilizada até agora pelo governo no tratamento desse assunto;
10) Porque responderá, enfim, à indagação feita por Alceu Amoroso Lima, em 23/10/74, no seu artigo ``Os esperantes": ``Até quando haverá, no Brasil, mulheres que não sabem se são viúvas; filhos que não sabem se são órfãos; criaturas humanas que batem em vão em portas implacavelmente trancadas, de um Brasil que julgávamos ingenuamente isento de tais insanas crueldades?"

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