São Paulo, domingo, 14 de maio de 1995
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Juízes deveriam sofrer impeachment

LUIZ FRANCISCO CARVALHO Fº
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Há uma insatisfação difusa em torno do funcionamento da Justiça. O controvertido e recente discurso do senador Antônio Carlos Magalhães (PFL) é apenas uma senha desse sentimento. A proposta de ``passar a limpo" o Judiciário estimula muita ingenuidade: depois de Collor (Executivo) e do caso João Alves (Legislativo), uma CPI dedicada ao terceiro Poder revelaria as mazelas que faltam...
Pode até ser, mas uma CPI, bem temperada pela mídia, revelaria as ``mazelas" de qualquer instituição, da CUT à Academia Brasileira de Letras.
O Judiciário é uma instituição complexa. Uma coisa é a Justiça do Trabalho e a presença constrangedora dos ``juízes" classistas, outra coisa é a Justiça Militar e sua conivência com os abusos da PM, outra coisa é a Justiça comum, que, em São Paulo pelo menos, é razoável e se moderniza.
Há muita incompreensão. Querem a Justiça rápida, mas, muitas vezes, é bom que a Justiça seja cautelosa. Querem eliminar formalidades, mas formalidades são garantias. Querem Justiça obediente aos anseios populares, mas a Justiça deve evitar o contágio da opinião pública.
Alguns problemas são visíveis na instituição como um todo. O excesso de solenidade ainda habita o espírito da magistratura. Justiça é simplesmente serviço público. Assim como é necessário tratar a água das cidades, é preciso cuidar dos conflitos com eficiência. Rococó e privilégios funcionais alimentam uma mentalidade provinciana.
O desaparelhamento material é grave. Faltam juízes, equipamentos e pessoal qualificado. Os concursos não preenchem as vagas disponíveis porque os salários são desestimulantes e as faculdades são de mentira.
O Judiciário não tem controle externo e isso não se resolve com a criação de um conselho corporativo para fiscalizar. Os juízes não podem ser punidos pelo teor de suas decisões jurisdicionais, mas os desvios de conduta do interesse público deveriam ser submetidos ao Parlamento, por qualquer um, pelo processo de impeachment.
O juiz está livre das regras de hierarquia. Ele próprio é, nas palavras de Tércio Sampaio Ferraz Jr., ``uma expressão originária do poder estatal". Falta de decoro, abuso de autoridade, desídia ou nepotismo deveriam ser levados a julgamento político.
Os Códigos são velhos e a atuação legislativa do Congresso tem sido infeliz, marcada pelo imediatismo, pela demagogia e pela falta de rigor técnico.
Em nome da ``governabilidade" medidas inconstitucionais são toleradas no Brasil: o Supremo Tribunal Federal demorou muito tempo por exemplo, para descobrir que o sequestro da poupança era ilegal. A complacência da cúpula, além de atolar a Justiça Federal de processos movidos por empresas e indivíduos lesados, abala a imagem da instituição. Esse talvez seja o principal pecado do Poder Judiciário desde a abertura democrática.

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