São Paulo, domingo, 14 de maio de 1995
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Pelé diz ter saudades da época do gol 'esquecido'

VALMIR STORTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Edson Arantes do Nascimento, 54, não comentou o erro na contagem dos seus gols. A Folha tenta falar com ele sobre o assunto desde março. O ministro dos Esportes só concordou em responder rapidamente sobre seu período no Exército. ``Foi um dos mais importantes da minha vida", disse, vendo foto em que aparece ao lado do ponta Bataglia, companheiro de seleção militar.
Em 1959, quando servia o 6º Grupo de Artilharia de Costa Motorizado, Pelé chegou a disputar três competições simultâneas. Atuou sete vezes em novembro antes do dia 18, data do gol ``esquecido" pela história oficial de sua carreira.

Folha - Como você analisa hoje seu período no Exército?
Pelé - Foi difícil para chuchu. Muito puxado. Na época, eu jogava na seleção militar, no Santos e na seleção brasileira. Apesar disso, foi uma lição de vida muito grande. Senti saudades.
Folha - Quais lições de vida?
Pelé - Aprendi a costurar, a pregar botão, a cozinhar. São coisas boas de se aprender. Gostaria que todo jovem passasse por isso.
Folha - Seu filho também?
Pelé - Queria que o Edinho (hoje goleiro no Santos) fizesse, mas na época ele estava nos EUA.
Folha - Você queria servir?
Pelé - Como voltei da Suécia campeão do mundo, achei que podia escapar, como outros jogadores. Na verdade, falei com o deputado Athiê Jorge Cury (ex-presidente do Santos) para não servir. Ele foi falar com o coronel Osman (também do clube). O coronel perguntou: ``O que vamos dizer para o povo? Que sua saúde está ruim? Que seu pulmão está ruim? Que você tem pé chato?" (risos)
Folha - A vida era puxada?
Pelé - Eu servia em Santos e dava patrulha no porto. Passava com a carabina perto dos bares e via os outros jogadores do Santos. Todo mundo me gozava.
Folha - Chegou a atrapalhar seu desenvolvimento no Santos?
Pelé - Eu tinha que cumprir os jogos. Viajava com a farda do Exército. Em compensação, estava sempre bem fisicamente. O Lula (técnico) me poupava porque não havia necessidade de eu treinar. Fazia só aquecimento e massagem.
Folha - Mas hoje há jogadores atuando demais...
Pelé - Vejo os garotos do Palmeiras e do São Paulo reclamando. Agora eles têm tudo de bom, campo bom, condições melhores...
Folha - Hoje os atletas fazem mais treinos físicos?
Pelé - A idéia hoje é formar gladiadores.
Folha - Reclama-se demais?
Pelé - Acho que sim. Isso vem de acordo com a conotação social do país. Eles perderam o amor à camisa. Se joga no Palmeiras e o Corinthians oferecer dez mil réis, ele começa a pensar em sair. Eles não respeitam mais a profissão.

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