São Paulo, terça-feira, 16 de maio de 1995
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ONU nomeia brasileiro relator de direitos humanos no Burundi

CLAUDIO JULIO TOGNOLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Pela primeira vez em sua história, a Organização das Nações Unidas (ONU) nomeou um brasileiro para o cargo de relator.
O cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, responsável pelo Núcleo de Estudos de Violência, da USP, embarca para o Burundi em julho.
Há dez dias a ONU nomeou-o relator especial para a situação dos direitos humanos no Burundi. Há, no mundo, apenas 25 relatores da ONU. São eles os responsáveis pelas diretrizes políticas que a ONU adota em relação aos países.
Paulo Sérgio faz uma visita inicial de 15 dias ao Burundi. Depois, passa uma semana por mês no país, anotando suas impressões. Eis o que revelou em entrevista exclusiva à Folha.

Folha - Por que a indicação de um brasileiro para o cargo?
Paulo Sérgio Pinheiro - Isso não ocorreu antes porque faz muito pouco tempo que o Brasil reingressou no sistema internacional de proteção dos direitos humanos.
Só depois da volta da democracia é que o Brasil se vê envolvido na Comissão de Direitos Humanos da ONU. Também é só depois dos anos 90 que os principais tratados e convenções de direitos humanos são ratificados.
Folha - É a primeira vez que um brasileiro ganha uma relatoria da ONU?
Pinheiro - Segundo consta, parece que sim, segundo o Itamaraty informou. Depois dos anos 70 há, na Comissão de Direitos Humanos, dois tipos de relatoria: as temáticas, por exemplo, sobre tortura, desaparecimento, e relatorias sobre países, um relator sobre Cuba, outro sobre Myanma, etc. Ao todo, há 25 relatores no mundo.
Folha - Qual será sua rotina?
Pinheiro - Como diz o próprio nome, devo apresentar relatórios para as assembléias gerais da ONU, no mês de setembro.
Isso também corresponde ao período da abertura das reuniões da Comissão de Direitos Humanos da ONU em Genebra. Aí os relatores também apresentam relatórios.
No início, devo ir ao Burundi por um prazo de 15 dias, depois vou ter visitas regulares. Em maio tenho uma reunião com todos os relatores e peritos da ONU. A visita ao Burundi é uma visita de muito trabalho. Você tem de se entrevistar com autoridades, sociedade civil, outros especialistas.
Folha - O que você espera encontrar no Burundi?
Pinheiro - Os problemas do Ruanda e do Burundi são típicos de uma colonização européia que tentou interferir em processos sociais e políticos internos, com resultados totalmente desastrosos.
Por exemplo, o aprofundamento das diferenças étnicas entre os hutus e tutsis, que é o problema básico. À medida que você "etniza os conflitos na sociedade, as soluções se tornam extremamente problemáticas. A guerra passa a ser um acontecimento cultural.
Folha - O governo brasileiro tenta obter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Sua relatoria não facilitaria essa luta?
Pinheiro - Os relatores são escolhidos a título individual. Não tenho nenhum vínculo com o governo brasileiro. O fato de ser brasileiro evidentemente marca maior presença brasileira no debate de direitos humanos.
O Brasil está hoje presente na globalização dos temas internacionais. O lugar no Conselho de Segurança vem na esteira da maior presença. O país se "desprovincianiza, fica menos etnocêntrico.

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