São Paulo, quarta-feira, 17 de maio de 1995
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A central patronal

FERNANDO BEZERRA

A idéia de criação de uma entidade empresarial que fale por todos os segmentos econômicos, a exemplo do que ocorre com os trabalhadores, vem sendo defendida por setores importantes do governo, do Congresso Nacional e, principalmente, da própria classe empresarial.
Do ponto de vista teórico, tomando como medida de avaliação a lógica e o senso comum, o argumento favorável à existência de uma entidade associativa superior com tais características é imbatível.
No aspecto prático, contudo, o assunto revela-se bem mais complexo.
O conhecimento da experiência de outros países seria uma forma de nos aproximarmos do tema. A CNI (Confederação Nacional da Indústria) desenvolve, há vários anos, parcerias com o órgão de cúpula do empresariado japonês (Keindaren), o que nos tem proporcionado a oportunidade de verificar o peso que a atuação conjunta proporciona ao empresariado naquele país quando se trata da fixação de políticas públicas relacionadas ao funcionamento da economia. Outras nações têm merecido estudos específicos, cabendo referir os que se voltaram para a França e a Espanha, mais próximas de nós pela comum origem latina.
O Conselho Nacional do Patronato Francês (CNPF) atua nas grandes questões de princípio e tem conseguido que a posição do empresariado seja conhecida da opinião pública e levada em conta quando se impõem as grandes definições. A criação do Mercado Comum Europeu exigiu enorme esforço de conciliação de interesse, que teria sido frustrado caso não se dispusesse de interlocutores credenciados como o CNPF.
No caso da Espanha, a Confederação Espanhola das Confederações Empresariais (Ceoe) resultou da fusão, em 1977, de entidades preexistentes, com o propósito de inaugurar uma nova fase na atuação empresarial, tornada imperativa diante da abertura política.
No curto período de sua existência, a Ceoe desempenhou um papel fundamental, ao lado das entidades dos trabalhadores e dos partidos políticos, na estruturação do pacto social que se seguiu ao grande acordo político conhecido geralmente com a denominação de Moncloa.
A negociação de alto nível de questões como remuneração salarial ou manutenção dos níveis de emprego revelou-se essencial na eliminação pacífica do franquismo e na conquista da notável estabilidade política que a Espanha tem desfrutado.
É bom ressaltar que a existência de um órgão coordenador de âmbito nacional nos países mencionados não interfere no funcionamento de organizações setoriais, em seus respectivos níveis.
No caso brasileiro, a tentativa que empreendemos, na fase inicial da transição do sistema militar para o governo civil, em 1985, de constituir uma entidade com tais atribuições -a UBE (União Brasileira de Empresários)- não foi bem sucedida, por diversas razões.
A principal delas, talvez, haja consistido no fato de que não tenha sido precedida por um amplo trabalho de discussão e convencimento das lideranças dos diversos setores. Dessa forma, a UBE não chegou a conquistar o requerido mandato para falar em nome dos seus pares. Dessa circunstância, resultou que se tenha limitado a congregar os presidentes das confederações patronais, que, por sua vez, não estavam dispostos a abdicar dos poderes com que contavam em suas entidades.
Para atender à exigência que se vem configurando, a que nos referimos no início, creio que precisaríamos dar mostras de que aprendemos com a experiência e não incidir nos mesmos erros do passado. Não cabe começar pelo mais difícil, isto é, a criação de uma entidade que a todos representaria. Isso já se mostrou impraticável.
O mais factível seria concentrar as nossas energias no sentido de encontrar uma agenda comum. Em torno de uma pauta concreta, empreenderíamos iniciativas capazes de expressar perante a opinião pública o nosso posicionamento, principalmente quanto à definição de uma estratégia de desenvolvimento dentro de um quadro institucional estável, com regras claras e permanentes.
De certa forma, isto foi tentado com razoável eficiência durante a pretendida revisão constitucional de 93/94, sob a coordenação do empresário Jorge Gerdau Johannpeter, que, por não dirigir entidade alguma específica e gozando de inegável conceito em todos os segmentos empresariais, conseguiu transitar com grande desenvoltura entre seus pares. Não fosse a época inoportuna, tendo em vista o calendário eleitoral, tenho certeza que a ação empresarial teria sido coroada de razoável sucesso.
Agora, mais uma vez, temos a oportunidade de trilhar o mesmo caminho com a revisão constitucional que está sendo proposta pelo governo.
Existem temas comuns que dizem respeito à própria sobrevivência do estilo de vida que nós defendemos, dentro de uma sociedade que se quer liberal e democrática, que precisam ser defendidos.
Quando se prega a necessidade de uma ação conjunta, não estamos reivindicando privilégios para uma determinada classe, mas nos referindo a conceitos-símbolos no modo de vida que o nosso país escolheu, através do voto da maioria, que impõe muito mais deveres do que direitos.

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