São Paulo, sexta-feira, 19 de maio de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Malabarismo malufista

JOSÉ MENTOR

Quem viu alguma das numerosas e caras propagandas (pagas, evidentemente, com o dinheiro dos contribuintes) sobre o chamado projeto Cingapura ficou com a impressão de que o problema das favelas em São Paulo foi resolvido como em um passe de mágica pelo sr. Paulo Maluf. Nada mais falso.
Até agora, em três anos de administração, o alcaide entregou minguados 240 apartamentos. São apenas 12 prédios construídos, esperta e demagogicamente, em áreas de visibilidade, no mais puro estilo de antigos prefeitos do interior, que marcavam suas gestões com vistosas fontes luminosas nas pracinhas das cidades.
Esses resultados modestíssimos na área de habitação popular tornam-se ainda mais dramáticos quando se considera que trazem benefícios a apenas parte de seis favelas, e a cidade conta com nada menos que 1.592 áreas faveladas.
E não é só. Enquanto na administração petista de Luiza Erundina (que entregou 15 mil casas e viabilizou outras 8.000, sem falar nas 28 mil unidades entregues pela Cohab-SP) o preço por metro quadrado, no regime de mutirão, era de US$ 115, no sistema malufista ele sobre para US$ 225.
Um mínimo de bom senso está a mostrar que o sistema por mutirão deveria ser retomado com intensidade, bem ao contrário do que fez Maluf, que, sob falsas alegações de que os mutirões não prestavam contas, paralisou a construção de nada menos que 8.000 casas populares já iniciadas.
O processo verticalizado (por sinal, adotado pela primeira vez na administração petista nas favelas da Água Branca, Minas Gás e Heliópolis) pode ser aperfeiçoado e profundamente alterado de forma a permitir preços menores e condições mais justas de pagamento por parte da população moradora em favela. Como está hoje o projeto, o pagamento de R$ 57,00 mais R$ 17,00 (?) de condomínio e ainda água e luz, para quem não tinha despesa com habitação e ganha entre zero e três salários mínimos, pode significar a impossibilidade de morar no Cingapura.
Assim, se as condições não forem alteradas, há sério risco de que as poucas unidades do projeto acabem sendo transferidas a famílias de fora das favelas.
De forma alguma, apesar do número reduzido de apartamentos a serem construídos até sua fase final, o Cingapura pode ser utilizado como forma de remoção branca de moradores em favelas e de integração de áreas do município ao mercado imobiliário.
Quem conhece, porém, as reais intenções do prefeito Maluf sabe que dificilmente ele modificará seus objetivos. E o Cingapura continuará sendo, não a solução para o problema da moradia para os quase 1 milhão de moradores de favelas, mas outra demagógica vítima a ser exibida a incautos eleitores, dentro dos conhecidos processos do malabarismo malufista.
Cingapura? Até aqui é pura ginga. ``Muito barulho por nada", como diz a obra de Shakespeare. É Ginga Pura.

Texto Anterior: PM destrói plantação de maconha
Próximo Texto: Homem é acusado de matar mulher e filho
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.