São Paulo, sexta-feira, 19 de maio de 1995 |
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Agricultura, leis trabalhistas e dekasseguis
SHIGEAKI UEKI Pode, aparentemente, não haver correlação entre a agricultura, as leis trabalhistas, os tribunais especiais e os dekasseguis (denominação dada no Japão aos descendentes de japoneses residentes no Brasil que foram àquele país em busca de emprego). Mas ela existe.O ministro da Agricultura, Andrade Vieira, que dirige uma pasta de fundamental importância social e econômica, propôs revisão das leis trabalhistas, dos tribunais especiais de Justiça do Trabalho, objetivando um melhor ajuste entre o quadro mundial e o nacional, principalmente para que se multiplique o número de empregos e, consequentemente, aumentem a renda e a produção agrícola nacionais. Ele recebeu críticas sob a alegação de que a agricultura nada tem a ver com as leis trabalhistas. Como não? Quem ignora que há anos as leis trabalhistas que regulavam as relações de trabalho nos setores de serviço urbano, comércio e indústria foram estendidas ao campo sem maiores estudos e discussões, visando a proteger o trabalhador rural? E qual foi a consequência? Desorganizou-se o setor agrícola, nasceu a triste categoria dos ``bóias-frias", aumentou o número de trabalhadores sem carteira e elevou-se a migração para os centros urbanos, multiplicando-se as favelas. Enfim, o resultado foi negativo e os trabalhadores do campo, momentânea e ilusoriamente beneficiados, foram os grandes sacrificados. A legislação trabalhista para indústrias como as de petróleo, têxtil e tantas outras também tornou-se inadequada e constitui inegável fator de aumento de custo. A Petrobrás, frequentemente criticada por pagar taxa de periculosidade a todos os seus empregados, não concedeu essa regalia como abuso de generosidade. Foi a própria legislação imposta pelos tribunais que praticamente obrigou o seu pagamento. Muitas indústrias privadas fazem o mesmo. A rigidez imposta pela legislação nas relações de trabalho com os marítimos, os trabalhadores nas plataformas marítimas etc. também se constitui em fator negativo para o desenvolvimento do setor. O professor José Pastore, em seu livro ``Flexibilização dos Mercados de Trabalho e Contratação Coletiva", de 1994, defende os mesmos princípios que levaram o ministro Andrade Vieira a apresentar ao ministro Jobim as mencionadas ponderações. Se setores organizados pedem realismo, mais flexibilidade para melhorar as condições dos trabalhadores, das empresas e da própria economia nacional, é preciso não excluir o setor agrícola, que é onde a atual legislação trabalhista causa os maiores danos. Resumidamente, para aumentar a taxa de emprego no setor agrícola, urge uma radical mudança na legislação trabalhista. Quantos pequenos e médios empresários agrícolas tornaram-se dekasseguis por causa desse anacronismo? Hoje, mais de 50% dos trabalhadores não têm carteira de trabalho, registro, qualquer contrato, isto é, vivem na economia informal. Que melhor demonstração pode haver de que a atual legislação trabalhista é inadequada, prejudicial para os trabalhadores, tanto para os urbanos quanto, e muito mais, para os trabalhadores rurais? A legislação trabalhista para o campo criou a figura do ``gato", isto é, agentes que atuam como locadores de mão-de-obra para serviços de plantio, desmatamento, colheita etc. A verdade é que, sem os ``gatos", não haveria agricultura brasileira. Rarissimamente processos trabalhistas envolvem a figura do ``gato", por razões óbvias. Abundam, porém, os casos envolvendo pequenos e médios empresários agrícolas que, cansados e aborrecidos com as reclamações trabalhistas, resolveram abandonar suas atividades e emigraram como dekasseguis. Esses pequenos e médios empresários agrícolas estão aguardando um quadro mais moderno de relações de trabalho. Rezam por uma inflação suportável, uma política agrícola mais condizente e leis que todos possam cumprir. Junto com uma segurança maior, esperam, sobretudo, menor confisco (para não dizer extorsão), a fim de voltarem ao país que tanto amam. É hora de os líderes agrícolas conscientes, sejam eles trabalhadores ou empresários, levantarem suas vozes em apoio ao ilustre ministro e discutirem seriamente as oportunas e necessárias sugestões. Texto Anterior: Pressão extemporânea; Seleção automática; Em Minas; Curva dos juros; Dinheiro de fora; Hora da refeição; Margem transferida; Questão de ordem Próximo Texto: Saiba como compensar imposto pago a mais Índice |
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