São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 1995
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O Cingapura irrita o PT

BRUNO FÉDER

A paixão político-partidária turva qualquer raciocínio. Mas, quando é a acrescida de má-fé, a coisa piora, como no artigo sobre o projeto Cingapura, do vereador José Mentor (PT), publicado neste espaço (19/5).
Como integrante da oposição ao prefeito Paulo Maluf, o vereador tem o direito democrático de divergir da administração, mas extrapola quando falseia dados.
O projeto Cingapura, de reurbanização e verticalização de favelas, não tem, ao contrário do que afirma Mentor, a pretensão de resolver o déficit habitacional da cidade de São Paulo em quatro anos. No máximo, será possível erradicar 30% das atuais favelas, substituindo-as por bairros com toda infra-estrutura. Em um ano e meio já foram inaugurados 11 Cingapuras, com 220 famílias instaladas. Até o final do ano serão entregues mais 1.200 apartamentos.
O principal mérito do projeto não reside, porém, em números, embora também esses lhe sejam favoráveis. O principal mérito, que irrita opositores políticos, é que ele aponta uma saída inovadora para a solução do problema.
Quando a recessão e o desemprego fizeram proliferar favelas, deteriorando a paisagem das cidades, o poder público foi pressionado a intervir. A primeira solução esboçada foi a ``remoção" das favelas, ``varrendo" o problema para a periferia. Não adiantou. Os favelados ou resistiam à remoção ou retornavam ao local.
Adotou-se então o paternalismo: ``melhorava-se" a favela, que continuava favela e até curral eleitoral de políticos de variados matizes ideológicos. Na gestão de Luiza Erundina incentivou-se como nunca a favelização.
O projeto Cingapura, ao contrário, fundamentou-se em três vertentes. Primeira: ninguém é removido. Enquanto os prédios são construídos, os moradores ficam em alojamentos provisórios. Segunda: ao contrário dos mutirões, o padrão das obras reduz o desperdício de material e o tempo de construção -um prédio fica pronto em 180 dias, em vez dos quatro anos que a gestão petista levou para fazer casas sem qualquer infra-estrutura. O custo por m2 é R$ 190 e não os US$ 225 mencionados por Mentor.
Finalmente, e mais importante, o Cingapura não é paternalista. As prestações são simbólicas, os prazos dilatados, mas cada família deve pagar pelo imóvel e nele permanecer por obrigação contratual, evitando-se a formação de mercado paralelo dos apartamentos. Em resumo, foi assim que as favelas foram banidas de Cingapura, e poderão ser erradicadas também em São Paulo e no Brasil. Pode irritar o PT, mas restitui ao favelado dignidade e cidadania. Mesmo não estando mais no PPR e ocupando agora a liderança do PFL na Câmara Municipal, estou à vontade para defender as virtudes que sempre defendi no projeto Cingapura.

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