São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 1995
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Solitária do artista ainda tem infiltrações

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DO ENVIADO AO RIO

O ``ateliê" em que Bispo trabalhou difere bastante dos 150 metros quadrados que sua obra ocupará em Veneza. É um quarto-forte de cinco metros quadrados, de paredes enegrecidas por infiltrações, com uma latrina ao canto.
Está quase como deixou, não fosse a presença do ``Índio Marrom", doente que herdou o local.
A solitária fica num horrendo pavilhão do Conjunto Ulisses Viana, prédio térreo que data da fundação da colônia, em 1924.
O ambiente ultrapassa o pestilencial. Doentes jogam as roupas no telhado e andam nus. Desde 1981 não há internações. A média de idade dos doentes é de 54 anos. Alguns costumam apedrejar qualquer veículo que se aproxime.
Bispo foi trancafiado ali em 1964. Quando lhe abriram a porta, na última década, não quis sair. Lentamente, fez o pavilhão virar galeria de arte.
Os internos se lembram dele. Conta um: ``Foi invadindo outras celas e o corredor. Punha tudo em ruas, com placas com nomes".
``Tinha o cabelo puxado para trás. Não saía nem falava", diz o interno Herculano da Silva, 55. ``Passava os dias fazendo navios."
Um enfermeiro conta que ele era agressivo. Ajudava os enfermeiros a conter os mais furiosos. ``Ganhou confiança dos enfermeiros, que lhe compravam objetos."
Tão logo foi enterrado, os funcionários do hospício tentaram saquear suas obras.
(LAG)

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