São Paulo, terça-feira, 23 de maio de 1995
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Libertem os reféns

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Fica cada vez mais difícil entender o que governo e petroleiros querem provar nessa greve sem fim.
Dá a impressão de que o governo quer demonstrar que pode romper impunemente um compromisso assumido. E de que os petroleiros querem provar que desobedecer a uma decisão judicial é simples, fácil, cômodo e sem castigo.
Se for esse o jogo, qualquer que seja o vitorioso, o perdedor serão os costumes políticos em um país que não é exatamente exemplar nessa matéria.
Se fosse apenas uma discussão entre patrão e empregados, poderia durar indefinidamente sem maiores traumas para o público em geral. Mas trata-se de uma queda-de-braço em que o consumidor, único inocente na história, é mantido como virtual refém de desígnios políticos de uma parte e outra.
Não parece aceitável que o governo queira quebrar a espinha da CUT à custa de pôr em risco o abastecimento de insumos indispensáveis ao cotidiano das pessoas, como o combustível e o gás.
Ou que os petroleiros queiram demonstrar a validade de se manter o monopólio da Petrobrás submetendo o público a idêntico constrangimento.
O pior de tudo é que nem governo nem petroleiros explicitam os objetivos políticos por trás dos argumentos formais, curiosa e paradoxalmente ambos válidos e ambos condenáveis. O governo teria toda a razão em apegar-se ao estrito cumprimento de uma decisão judicial, se não tivesse ele próprio violado antes a palavra empenhada.
Os petroleiros teriam também toda a razão em exigir a obediência a um acordo, se não tivessem atropelado uma decisão judicial. O TST, agora questionado, já tomou muitas decisões favoráveis a trabalhadores do Estado, que contrariavam posições do governo de turno. Nessas ocasiões, nem a CUT nem os petroleiros desqualificaram a decisão do tribunal.
Consta que o relator do recurso impetrado pelos petroleiros contra a primeira decisão do TST emitirá parecer salomônico: dirá que a greve é abusiva, sim, mas que a Petrobrás tem, sim, que respeitar o acordo anterior com os petroleiros.
Parece o único caminho mais ou menos sensato para sair-se do impasse e, acima de tudo, libertar os reféns, o público consumidor.

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