São Paulo, quarta-feira, 24 de maio de 1995
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Para Wim Wenders, centenário do cinema já passou

AMIR LABAKI
DO ENVIADO ESPECIAL A CANNES

Wim Wenders participa hoje em Cannes de uma entrevista coletiva sobre a preservação de filmes, ao lado de Manoel de Oliveira, Nagisa Oshima e Nélson Pereira dos Santos, entre outros. O ponto de partida é o Projeto Lumière, iniciativa pan-européia das principais cinematecas.
O centenário do cinema foi o principal assunto da entrevista que o diretor de ``Paris, Texas" (1984) concedeu ontem à Folha. Wenders comentou o encarte ``Os Dez Melhores Filmes" cuja edição francesa está sendo distribuída durante o festival. Falou ainda do filme que exibiu aqui fora de competição, ``História de Lisboa", e de ``Além das Nuvens", que co-dirigiu com Michelangelo Antonioni.

Folha - Na pesquisa com cem críticos que originou este encarte, o único cineasta alemão presente na lista dos dez filmes é F. W. Murnau, com uma produção americana, ``Aurora" (1927). Como você vê isso?
Wim Wenders - Fico contente. Não gosto muito desse tipo de lista, mas se tivesse que escolher um filme alemão teria escolhido ``Aurora". É a obra-prima. Se não fosse ele, acho que teria que ser ``Metrópolis" de Fritz Lang.
Folha - O primeiro colocado foi ``Cidadão Kane".
Wenders - Esta lista me parece cada vez mais previsível...
Folha - Mesmo ``Aurora"?
Wenders - Não, essa foi uma surpresa. Uma boa surpresa.
Folha - De Ozu, um de seus diretores prediletos, foi escolhido ``Viagem a Tóquio". Teria seu voto?
Wenders - Não é meu Ozu preferido, não dá agora para fazer minha lista, mas entendo sua inclusão. É o mais acessível de seus filmes. Foi o primeiro dos filmes de Ozu que tive a chance de ver. Acho que quem tem alguma ligação com o Japão tem neste filme uma boa introdução.
Folha - O senhor está preparando algo especial para celebrar o centenário?
Wenders - Sim, estou finalizando um curta-metragem que fiz com alunos da escola de cinema de Munique, onde me formei. É uma comédia tipo pastelão dedicada aos pioneiros alemães do cinema, os irmãos Skladanowsky. Eles não tinham muita cultura, vieram do circo, mas fizeram a primeira sessão de cinema para o público.
Não eram bons técnicos, trabalharam com o bioscópio que era uma câmera atrasada com duas lentes, bastante inferior à desenvolvida pelos Lumière. Mas esta questão de data é meio boba, acho que o centenário mesmo foi celebrado há três anos, a partir da primeira filmagem, de Thomas Edison, em 1892.
Folha - Como foi filmar com Antonioni?
Wenders - Michelangelo me procurou para ser seu diretor substituto, uma exigência dos produtores. Ninguém queria financiar o filme de um diretor que está sem condições de falar. Claro que topei. Concretamente, Michelangelo rodou cada plano de ``Além das Nuvens". Não tive que substituí-lo. Aos 84 anos, ele fez um belíssimo filme sobre a vontade de viver. ``Além das Nuvens" vai ser lançado no próximo festival de Veneza, em setembro.
Folha - É fato que o escritor americano Paul Auster deveria ter escrito ``História de Lisboa"? O que aconteceu?
Wenders - Esta é uma confusão comum. Eu e Paul estávamos escrevendo um filme histórico passado em Lisboa. Veio o convite para fazer um filme dedicado a ``Lisboa, Capital da Europa". Adiamos nosso projeto. Fiz ``História de Lisboa". Pretendo logo retomar o roteiro com Paul.

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