São Paulo, quarta-feira, 24 de maio de 1995
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Maturidade produtiva

NORBERTO ODEBRECHT

Algumas das tendências prenunciadas para o futuro apontam, felizmente, para a mudança de um fato indiscutível -o de que as sociedades ocidentais, em contraste com as orientais, reservam papel pouco nobre às pessoas de idade avançada. Tais tendências são evidenciadas:
- na prioridade crescente dos temas da saúde e do meio ambiente, reflexo da necessidade do ser humano de conviver melhor consigo mesmo, com seus semelhantes e com a natureza;
- no envelhecimento das populações, devido à redução das taxas de natalidade e ao aumento progressivo da expectativa média de vida;
- nos custos, cada vez maiores, que esse envelhecimento representa, em termos de previdência e de tratamento dos idosos.
Apontam na mesma direção tendências mais genéricas, como a globalização da economia e a revolução da informática, graças às quais o conhecimento produtivo destaca-se como o principal fator competitivo de países e organizações empresariais.
Vivendo mais e melhor, numa sociedade que solicita crescentemente o seu conhecimento acumulado, o idoso valoriza-se cada vez mais -embora a maioria dos brasileiros dessa idade esteja hoje distante de uma velhice digna.
O problema vivenciado pela maior parte dos aposentados, em todo o mundo, é o hiato que surge em suas vidas após a aposentadoria. A sensação de vazio, de desamparo, de inutilidade, faz com que percam o ânimo e a alegria de viver.
Muitas empresas contribuem para isso ao afastar seus empregados justamente quando eles estão em sua fase mais produtiva e sábia.
Esse procedimento acaba produzindo um prejuízo incalculável e invisível, pois a empresa alija uma pessoa cujos conhecimentos, que ela própria ajudou a adquirir, possuem valor inestimável.
Ao agir assim, tais empresas seguem padrões fixados durante a Revolução Industrial, segundo os quais o que contava era a força muscular e não o intelecto. Dessa forma, induzem seus integrantes a uma vida improdutiva. Ocorre que vivemos hoje na sociedade pós-industrial, na qual o que importa é o poder do cérebro e não o dos músculos.
Na linha reta que une os clientes e os acionistas de uma empresa existem seres humanos de três gerações: a primeira é composta por jovens que, por meio da educação pelo trabalho, irão desenvolver a sabedoria necessária para aplicar o conhecimento adquirido; a segunda, formada por pessoas amadurecidas, que ocupam posição de liderança e que dominam o conhecimento aplicado, indispensável ao sucesso de seus negócios.
A terceira geração é formada por pessoas experimentadas pela vida, que devem ser realizadas enquanto cidadãos e envelhecer de maneira produtiva e digna. Esses seres humanos privilegiados são portadores de um imenso saber, o qual deve ser canalizado aos mais jovens mediante a prática da liderança e pela disponibilidade de tempo, pela presença e pelo exemplo.
Disse Sócrates que ``para indivíduos prudentes e bem preparados, a velhice não constitui peso algum". Saúde física e mental, portanto, será fruto do nosso viver cotidiano. A constante preocupação com nosso nível de qualidade de vida determinará o grau de higidez que teremos na terceira idade.
A visão da vida como um todo será, certamente, resultante da visão prazerosa com que passaremos a ver o trabalho -que nos dignifica e confere sentido maior à própria vida. Se o ser humano conseguir, pelo trabalho, acumular seu capital intelectual, será útil ao seu semelhante, deixando de cumprir mera obrigação para fazer algo sadio e realizador.
Para quem é dotado do espírito de servir, o trabalho é também uma forma contínua de prazer. Consequentemente, a ampliação do período da vida produtiva será, mais e mais, uma reivindicação daqueles para os quais servir ao próximo é antes um direito do que um dever.
É imprescindível que os líderes, situados normalmente na geração intermediária, apóiem os jovens na formulação de planos de vida e carreira de longo prazo, os quais devem ter propósitos ambiciosos, pois o que satisfaz o idoso de hoje dificilmente satisfará o de amanhã. E, certamente, só poderão cumprir esses planos se preservarem sua saúde.
Essa constatação abre campo novo e vasto para que os seres humanos, ao se tornarem mais amadurecidos, assumam crescente responsabilidade na educação e no desenvolvimento de novas gerações, visando a:
- oferecer inestimáveis contribuições ao futuro das organizações;
- transferir sua sabedoria aos mais jovens, orientando-os para a vida;
- encontrar uma tarefa desafiante, prazerosa e realizadora, capaz de dignificá-los junto à comunidade, e
- fazer de suas vidas algo, de fato, extraordinário, revestido de um significado especial.

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