São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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ACELERANDO OU PARANDO?

ANTONIO CARLOS SEIDL
DA REPORTAGEM LOCAL

A política de juros altos para desaquecer a economia neste inverno pode matar o Plano Real de pneumonia, segundo a avaliação de empresários.
``Banho gelado no verão refresca, mas no inverno dá gripe e pneumonia", diz Luiz Fernando Furlan, presidente da Abrasca (Associação Brasileira de Empresas Abertas) e do Conselho de Administração da Sadia.
E embora o governo negue, há quem afirme, como Mario Amato, ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, que o país já está a caminho da recessão.
Veja a seguir o que os empresários dizem sobre o atual ritmo da economia e suas perspectivas.
Boris Tabacof, diretor titular de Economia da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) - ``O Plano Real não vai caminhar para a recessão porque os juros começarão a cair em breve. Os efeitos desejados pelo governo com a política de juros altos estão sendo alcançados: saldo nas contas externas e desaquecimento da demanda. Assim, há espaço para um alívio gradual do arrocho ao crédito. O país precisa de recursos para investimentos para crescer sem pressões inflacionárias. Isso virá com a reforma constitucional."
Mario Amato, presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria) - ``A recessão já existe. As encomendas de máquinas e equipamentos caíram de 15% a 20% no mês passado. Isso é um sinal de menos investimentos, portanto de queda da atividade econômica. Juros altos são incompatíveis com a queda da inflação para cerca de 30% ao ano. Mas o governo dá mostras de que vai haver queda dos juros, através da redução da taxa de recolhimento compulsório de depósitos bancários junto ao Banco Central."
Luiz Fernando Furlan, presidente da Abrasca (Associação Brasileira das Empresas Abertas) - ``O Plano Real pode caminhar para a recessão porque, fazendo uma parábola, banho gelado no verão refresca, mas no invernon banho gelado dá gripe e pneumonia. As vendas pararam de crescer há 60 dias. Está na hora de temperar a água. Acho que o governo deveria começar a desarrochar gradualmente os juros para que a economia não passe de um extremo a outro. Não há recessão mas também não há euforia."
Henrique de Campos Meirelles, presidente do Banco de Boston e da Câmara Americana de Comércio de São Paulo - ``Acredito que o atual patamar elevado das taxas de juro está empurrando o Plano Real para a recessão. Isso é o efeito na economia dos altos níveis do depósito compulsório do qual as taxas de juro são uma consequência. O volume de dinheiro atualmente disponível para empréstimos e financiamento dos investimentos e das atividades produtivas do setor privado está muito baixo."
Roberto Teixeira da Costa, presidente do Ceal (Conselho de Empresários da América Latina) - ``As altas taxas de juro ameaçam o Plano Real a médio prazo porque impedem investimentos para o aumento da oferta de bens e serviços. As empresas entendem que o arrocho ao crédito é emergencial. Elas trabalham com um cenário de estabilização e não de recessão no segundo semestre. As empresas estão conscientes de que têm que investir para não perder fatia de mercado, mas estão adiando, e não cancelando, seus investimentos."
Humberto Mota, presidente da ACRJ (Associação Comercial do Rio de Janeiro) - ``Os juros altos são insustentáveis e levarão à uma queda da produção. Há sinais claros do início de uma recessão: várias empresas pararam seus investimentos e outras cancelaram o terceiroht"rno de produção. O maior exemplo de que os juros estão elevados foi dado pelo próprio governo. Captou US$ 900 milhões no Japão, a um juro de 6% ao ano, para escapar da taxa de 8% ao mês no mercado interno. O atual nível de juros leva à recessão."
Helge Karsten Reimelt, presidente da Bayer - ``O atual nível da taxa de juro prejudica os negócios porque dificulta os investimentos. A falta de investimentos e o arrocho ao crédito abrem o caminho para a recessão. Ninguém me convence de que a base para a prosperidade não seja o crescimento econômico. Não há recessão que seja boa. O governo está na corda bamba porque a transição de uma economia inflacionária para a estabilidad é difícil. Não deve, porém, exagerar na dose, reduzindo demais o nível da atividade econômica."
Sérgio Haberfeld, presidente da indústria de embalagens Toga - A recessão é necessária. Sou radical neste ponto porque só no Brasil se imagina que a queda da inflação de 50% ao mês para 2% ao mês ocorre com todo mundo feliz. A única forma de manter a inflação baixa é criar a recessão. Concordo com a política governamental de juros altos. A recessão é necessária até que todas as reformas estejam concluídas. Sem as reformas, o Plano Real corre o risco de estourar. Acredito qwue teremos mais recessão por um ano até os primeiros efeitos das reformas na economia.
Joseph Couri, presidente do Simpi (Sindicato das Micro e Pequenas Indústrias do Estado de São Paulo) - O Plano Real já passa por uma recessão. Cerca de 47% das micro e pequenas indústrias estão endividadas, 20% devem quebrar e a inadimplência atinge 35% delas. O governo, com os juros altos, queria matar um carapato, mas está matando um boi. Os juros altos estão quebrando o setor produtivo. O Brasil precisade um choque de oferta para ter investimento e emrpego, e não de juros elevados.
Roberto Nicolau Jeha, coordenador do GPPI (Grupo Permanente de Política Industrial), da Fiesp - Se os juros continuarem altos, tornando o crédito e os investimentos proibitivos, o Plano Real corre o risco de escorregar e cair na recessão. Mas acho que o governo já percebeu isso e vai abrandar os juros e a oferta de crédito. A recessão não interessa a ninguém. A rota de colisão do Real, que são os juros altos, será corrigida e teremos a estabilização da atividade econômica no segundo semestre em nível superior ao mesmo período do ano passado, mas nada explosivo.
Horacio Lafer Piva, diretor titular do Departamento de Pesquisas da Fiesp - Os juros altos representam um problema para o Plano Real porque engessam a economia. A economia fica sem irrigação pelafalta de crédito. Isso pode levar o plano à recessão. Mas tenho sentido que o Banco Central vai flexibilizar o crédito porque a economia perdeu velocidade com mais rapidez do que o governo esperava. Estou otimista a médio e longo prazo, mas preocupado a curto prazo. Quantas mortes sofreremos até que entremos no melhor dos mundos, que certamente virá?
Paulo Roberto Butori, presidente do Sindipeças (Sindicato da Indústria de Autopeças) - Acredito que os juros altos podem provocar uma recessão porque inibem o consumo e desestimulam os investimentos. Mas entendo que essa situação é um paliativo necessário. A única solução definitiva, sem efeitos tão danosos colaterais para a sociedade, é a revisão Constitucional. A revisão vai fornecer os instrumentos econômicos imprescindíveis para a criação de uma política econômica de longo prazo.

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