São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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De volta para o futuro

ANTONIO KANDIR

O dia 24 de maio marcou a volta do país ao mercado voluntário de capitais, após 15 anos de ausência. A última emissão ocorrera em junho de 1980, dois anos antes da crise da dívida externa fechar este mercado para o Brasil.
As empresas brasileiras já haviam retornado a ele, com volume crescente de captações a partir de 1990, mas o governo brasileiro permanecia excluído.
O Brasil promoveu a maior emissão de bônus jamais feita por um país latino-americano no mercado de euroienes. A receptividade superou as expectativas.
Tanto que o Branco Central aumentou a emissão programada, de 20 bilhões de ienes para 80 bilhões em moeda japonesa (US$ 916 milhões), mediante colocação de papéis de dois anos, com remuneração de 6% anuais.
O sucesso da operação indica credibilidade robusta do Brasil no mercado internacional de capitais, só cinco meses após o abalo provocado pela crise no México.
Abre ainda perspectiva de melhoria crescente nas condições de financiamento do setor público, com efeitos positivos sobre toda a economia brasileira, mediante troca de dívidas com custos maiores por dívidas com custos menores.
Após 15 anos estamos de volta, com um futuro promissor à frente, um futuro que já começou.
O retorno não é obra do acaso. Ele se tornou possível por força da ação combinada de dois fatores.
O primeiro são as mudanças estruturais decisivas, iniciadas no começo dos anos 90, como a abertura econômica e a desestatização.
O segundo é a implantação e gestão competentes do plano de estabilização.
A ação combinada destes dois fatores conformam um só processo: o da construção progressiva das bases da estabilidade e do desenvolvimento sustentáveis.
O sucesso da emissão dos bônus da República é expressão dos avanços neste processo.
Quanto mais nele avançarmos, maior será nossa capacidade de financiamento no mercado de capitais, com taxas de remuneração decrescente e prazos mais longos.
Nesta medida, a última semana nos reservou várias boas notícias.
Na segunda-feira, a Câmara aprovou a emenda que põe fim à discriminação contra o capital estrangeiro. Na quarta, a emenda que flexibiliza o monopólio das telecomunicações foi aprovada.
A aprovação desta última emenda representa a transposição de uma marca definitiva no processo de reforma da Constituição, pois as telecomunicações foram o primeiro setor ``estratégico" a entrar em pauta no Congresso, tendo a oposição se mobilizado em favor da manutenção do status quo.
Nem a bandeira nacional faltou em plenário, como se fosse patriótico e progressista votar contra a mudança que permitirá, sem perda do controle público, atrair investimentos privados para a modernização de um setor que se renova tecnologicamente à velocidade da luz.
Há entre a operação com bônus da República e aprovação da emenda das telecomunicações mais do que coincidência de datas.
À medida em que avançamos na reforma da ordem econômica, ampliam-se as perspectivas de captação voluntária de recursos externos pelo país.
Em consequência, alarga-se o raio de manobra das políticas monetária e cambial. Abre-se espaço para redução dos juros, com riscos diminuídos de se impor mudança abrupta no câmbio.
Vamos levando o barco à frente, em meio à travessia ainda delicada, com razões para ter confiança.
Não se pode esquecer, porém, que as batalhas decisivas para o ajuste estrutural das contas públicas ainda estão por vir.
Vencida a etapa da ordem econômica, entrarão em pauta as questões de natureza fiscal. Será hora de providenciar alicerces duradouros para o Plano Real e condições de participação ampliada e positiva do país nos fluxos internacionais de capital.

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