São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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A sinfonia que desafia o tempo

PAULO FERNANDO SILVESTRE JR.
DA REPORTAGEM LOCAL

O pesquisador alemão Günter Nimtz colocou Mozart contra Einstein. Ele diz ter conseguido transmitir a 40ª Sinfonia a 4,7 vezes a velocidade da luz no vácuo.
"Todos físicos concordam com nosso experimento. A discussão é se a causalidade (prevista na teoria da relatividade) foi violada", disse Nimtz à Folha.
O princípio da causalidade diz que todo efeito é posterior à causa. Mas, se um observador enviasse um sinal mais rápido que a luz para um segundo e este o devolvesse também mais rápido que a luz, o primeiro o receberia antes de tê-lo enviado, criando um paradoxo.
Para a proeza, Nimtz usou conceitos da mecânica quântica, a parte da física que estuda fenômenos relacionados a partículas.
Segundo eles, em condições especiais, chamadas de "tunelamento", partículas podem atravessar uma barreira física, sempre em um mesmo intervalo de tempo, qualquer que seja a espessura da barreira a partir de um valor crítico.
Dessa forma, quanto mais espessa a barreira, maior a velocidade da partícula, pois ela precisaria ser mais rápida para atravessá-la no mesmo intervalo de tempo.
O que Nimtz fez foi escolher uma barreira que forçasse as "partículas" (a sinfonia) a viajar a uma velocidade superluminal (acima da velocidade da luz).
Ele a transformou em microondas de FM e a transmitiu através de um "guia de onda", espécie de "encanamento" normalmente usado para experimentos como esse.
Nimtz sabia de antemão quanto tempo a luz levaria para percorrer o caminho se estivesse no vácuo. Como o tempo gasto para a "viagem" foi 4,7 vezes menor que o acima, ele concluiu que o sinal viajou 4,7 vezes mais rápido.
A escolha da sinfonia não se deve meramente a questões de gosto. Ela representa um sinal "grande" o suficiente para verificar se foi toda (e bem) transmitida.
As conclusões de Nimtz estão em um terreno onde não há palavra final. Vários físicos já realizaram experimentos superluminais, mas conseguiram passar apenas partes insignificantes do sinal.
"O princípio da causalidade é violado se você transmite (esses) sinais superluminais", explica Waldyr Alves Rodrigues Júnior, diretor do Instituto de Matemática, Estatística e Ciência da Computação da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Jayme Tiomno, um dos maiores físicos do país, não concorda.
"Nimtz fez um aperfeiçoamento com uma montagem especial para mostrar que é superluminal. Mas naquele trabalho do ano passado, ele já diz que isso não implica violação da relatividade", afirma.
As ondas que o receptor de Nimtz captou foram gravadas em uma fita cassete. Entre o chiado, podia ser ouvida a sinfonia que Nimtz diz ter viajado mais rápido que a luz.
Rogério Cézar de Cerqueira Leite, professor emérito da Unicamp e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos que não ficaram convencidos.
"Eu continuo com muitas dúvidas sérias sobre o que ele usou para as medidas", diz.
Segundo Rodrigues, tal procedimento de encontrar erros é comum, apesar de ele próprio acreditar nos resultados de Nimtz.
O cientista alemão tentou publicar suas conclusões na conceituada revista científica "Nature", mas foi recusado.
Segundo ele, a revista "não deu nenhuma informação sobre a recusa de publicação".

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