São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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Custo de guerra biológica atrai terroristas

DA ``THE NEW REPUBLIC"

É concebível que um país pudesse prolongar o impasse, afirmando a necessidade de um mandado de busca em nível nacional.
Talvez isso fosse verdade (se bem que no caso de fábricas químicas, já sujeitas a regulamentações do governo, essa desculpa não cole).
Além do mais, esse mandado pode acabar sendo impossível de se obter (por exemplo, se a busca solicitada fosse numa quadra de tênis coberta e a Opaq não dispusesse de provas legais de atividades ilegais no local).
Se tais apelos à soberania nacional transmitissem uma impressão muito forte de falsidade, a Opaq, através de uma votação entre seus países membros, poderia considerar que o país estava desobedecendo o tratado.
Não poderia mais obter dos países integrantes da Opaq (praticamente o mundo industrializado inteiro) uma gama de substâncias relevantes à guerra química.
E o corte no fornecimento dessas substâncias iria prejudicar fábricas que produzem artigos que variam desde pesticidas a plásticos, passando por cerâmicas e produtos farmacêuticos.
É nesta área que a CAQ se mostra inovadora, embora menos por intenção do que pelas condições tecnológicas vigentes.
Devido à flexibilidade da tecnologia química, o castigo previsto pela convenção equivale a sanções amplas e imediatamente sentidas contra a economia civil.
E essas sanções constituem boa razão para os países continuarem a obedecer o tratado, sem falar em subscrevê-lo, em primeiro lugar.
Se o país não faz parte do Opaq, seus integrantes não lhe vendem substâncias químicas.
Em certo sentido, as armas biológicas costumam ser superestimadas. As pessoas tendem a pressupor que elas operam lançando epidemias, quando na realidade a maioria das armas biológicas mata por exposição direta, exatamente como as químicas.
É claro que existem armas contagiosas. Os colonizadores norte-americanos deliberadamente deram aos índios cobertores contaminados com varíola; mais recentemente, pesquisadores militares tanto americanos quanto soviéticos fizeram experiências com alguns vírus de transmissão fácil.
Apesar disso, as armas contagiosas têm por hábito voltar para atacar o agressor. Por essa razão, as armas biológicas neste século envolveram principalmente coisas como esporos de antraz (uma espécie de bacilo, ou pústula maligna), que penetram nos pulmões das pessoas e geram bactérias que se multiplicam no organismo e acabam por provocar a morte, mas enquanto isso não contaminam a mais ninguém.
É possível que com o passar do tempo a engenharia genética venha a aumentar a probabilidade de uso de armas contagiosas. A engenharia genética abre a possibilidade de enfrentar um vírus assassino com uma vacina efetiva, de modo que o agressor pudesse ser imunizado.
Mesmo assim, o principal efeito da biotecnologia atual, até hoje -e tem sido dramático- tem sido a fabricação de armas tradicionais, como o antraz, de produção muito mais fácil e barata.
Para isso basta um local do tamanho de um porão comum, contando com equipamentos do tipo encontrado em laboratórios médicos comuns e companhias de biotecnologia. As receitas podem ser obtidas em bibliotecas universitárias, e os ingredientes -pequenas culturas de agentes patogênicos que podem ser rapidamente multiplicados em tanques de fermentação- são adquiridos rotineiramente de vendedores comerciais, ou passados em escolas.
As armas que podem resultar disso são espantosamente destrutivas. Um excelente relatório do Escritório de Avaliação Tecnológica sobre armas de destruição em massa estima que uma única ogiva de esporos de antraz que aterrissasse em Washington D.C., num dia de ventos moderados, seria capaz de matar entre 30 mil e 100 mil pessoas -um pouco mais perigoso do que uma bomba atômica do tamanho daquela despejada em Hiroshima, mas nada comparável à devastação que resultaria de uma ogiva nuclear moderna.
Além disso os esporos de antraz sobrevivem no solo, quando enterradas em locais não atingidos pela luz solar. A ilha Gruinard, onde a Inglaterra detonou uma bomba experimental de antraz durante a Segunda Guerra Mundial, ainda é inabitável.
Um avião que expelisse dez vezes essa quantidade de sarin mataria apenas 600 pessoas -ou, num dia de ventos mais fortes, 6.000. Além disso o ataque de sarin, devido a seus efeitos imediatos, provocaria o início da caça aos culpados antes mesmo de o avião aterrissar em seu destino.
O antraz, pelo contrário, leva dias para mostrar seus efeitos; o piloto poderia estar tirando férias no Caribe antes que o problema fosse percebido.

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