São Paulo, quinta-feira, 1 de junho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para Arida, dever de casa já estava feito

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

Os interlocutores de Pérsio Arida nos últimos dias não perceberam sinais de que ele estivesse para deixar a presidência do Banco Central. Mas vistos em retrospectiva, seus comentários parecem agora um balanço. Ele insistia, por exemplo, que havia feito ``o dever de casa" e que a política do BC já fora bem sucedida ao impedir o colapso do Plano Real.
Nessas conversas, Arida passava o argumento de que a política de restrição de crédito e juros altos tinha sido necessária para conter uma explosão do consumo que terminaria na volta da inflação.
Dado o diagnóstico, Arida insistia que a operação do BC havia sido um ``claro sucesso". Mostrava os sinais de desaquecimento e os índices que evidenciam a queda da inflação em maio.
Dizia que isso permitiria abrandar a política monetária, coisa que logo começaria a ser feita, mas moderadamente, mantendo-se a economia em ritmo lento. Foi, aliás, o que o Conselho Monetário Nacional fez ontem, ao aplicar uma pequena redução nos depósitos compulsórios dos bancos.
É possível especular que Arida estivesse determinado a deixar o BC desde março, quando sua imagem saiu abalada no episódio da desvalorização do real. Não apenas o processo foi atrapalhado, como saíram denúncias de que Arida teria passado informações privilegiadas a seu amigo, o presidente do Banco BBA, Fernão Bracher.
As denúncias não foram comprovadas, mas abalaram a convicção do homem público Pérsio Arida. Amigos seus acharam, naqueles dias, que ele não aguentaria ficar no BC. Aparentemente, Arida tomou a decisão íntima de sair naquele momento e preferiu esperar para efetivar a decisão num momento em que a situação é favorável a ele e ao Plano Real.
Essa também era a impressão captada ontem no Palácio do Planalto, entre assessores do presidente Fernando Henrique.
Desse ponto de vista, sua saída não levaria a mudanças de fundo no Real. Mesmo porque a política monetária vem sendo defendida uniformemente pela equipe econômica, toda ela mantida.
Segue-se aqui um resumo de comentários feitos por Arida em duas conversas recentes, uma na noite de segunda-feira, outra na quinta da semana passada. Nas duas ocasiões, Arida pediu reserva, respeitada pela Folha. Mas se produziram matérias explicando qual a política do BC, de modo que o leitor recebeu as informações apuradas pelo repórter.

CONSUMO
A economia estava explodindo em janeiro e fevereiro. Sem congelamento, que nunca iríamos fazer, isso ia dar em inflação. Já vivemos o Plano Cruzado e não poderíamos correr o mesmo risco.
O comércio externo é secundário neste momento. O problema é o nível de consumo interno, que estava incompatível com a estabilidade da moeda.

ARROCHO
O BC brasileiro fez o dever de casa que qualquer outro BC faria: uma política de contração monetária (redução da quantidade de dinheiro disponível na economia).
O BC vinha perseverando nessa política. A taxa de juros é a mesma desde março e os depósitos compulsórios, que os bancos são obrigados a deixar no BC, são exigidos desde o final de 94.
As pessoas diziam que o governo não é capaz de conter consumo, mas eu sabia que ia funcionar. E funcionou. Há desaquecimento e cai a inflação.

JUROS ALTOS
Foi uma decisão traumática. Mas sem o arrocho monetário, o Real não se consolida. Foram 11 meses de inflação baixa. Isso não se pode perder. Agora que o colapso foi evitado, todo mundo reclama e só vê o lado negativo.
Mas o desaquecimento e a queda da inflação vão permitir, logo, o abrandamento desta política.

CONTRADIÇÃO
As pessoas diziam que eram a favor do Real, mas se comportavam como se fossem contra. O sujeito que se endividou com juros altíssimos para comprar uma geladeira, em vez de poupar, estava obviamente achando que a inflação ia voltar. O governo tem que dar um tranco. Mas não haverá recessão.

QUEBRADEIRA
A Casa Centro quebrou. Mas as Lojas Americanas vão bem. Ou seja, não é quebradeira generalizada. Existem empresas mal administradas que vão se complicar.

PLANO REAL
Tem que manter a aposta no Real. São os mais pobres que perdem com a inflação e que ganham com o fim da inflação. É nosso primeiro dever eliminar a inflação.

Texto Anterior: Saída de Arida derruba Bolsa
Próximo Texto: Política cambial não muda, diz Mailson
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.