São Paulo, quinta-feira, 1 de junho de 1995
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Por favor, mudem o disco

ANTONIO AUGUSTO NEVES

A sociedade nunca aceitou nem aceitará os radicais. Julgam eles que só as suas verdades e os seus conceitos são os corretos, por mais que se lhes mostre a verdade real e o entendimento da maioria.
No último dia 23, esta coluna publicou artigo em que se abordava a competência da Justiça Militar estadual, enfocando de forma equivocada o assunto.
A respeito de projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados, passando para a competência do Tribunal do Júri os crimes dolosos contra a vida praticados por policiais militares contra civis e, ainda, que o uso da arma da corporação na hora de folga, no cometimento de um delito, não mais determinará a competência de quem deve julgar, mas sim o bem jurídico ofendido, foi dito ter essa questão sido ``mal discutida e pior votada".
Tal afirmação não levou em conta que os votos vencedores somaram o triplo dos vencidos. Alguns destes, os radicais, não se conformam com a decisão tomada pela maioria dos parlamentares, pois julgam que só o entendimento deles é o correto, ou seja, podar completamente a competência da Justiça Militar estadual.
Batem na tecla, já surrada, de que o chamado ``pacote de abril" provocou a alteração da jurisprudência, passando para a Justiça Castrense dos Estados, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, competência para processar e julgar os policiais militares pelos crimes cometidos no policiamento.
Omitem, entretanto, que esse mesmo pacote retirou de sua competência o julgamento de civis que pratiquem crimes em co-autoria com policiais militares.
Escondem, igualmente, que o Congresso Constituinte de 88, por ampla maioria, manteve a mesma redação da Lei Complementar 7/77, e, consequentemente, consagrou a jurisprudência já firmada pelos Tribunais Superiores de ser a Justiça Militar estadual a competente para julgar os delitos militares praticados pelos PMs em ações policiais. Também aqui o inconformismo dos radicais.
No tocante aos magistrados das Auditorias Militares, juízes aprovados em concurso público, examinados por comissão composta por advogado representante da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), por juiz da Justiça Comum, designado pelo Tribunal de Justiça, e por juiz da Justiça Militar, são nomeados pelo presidente do Tribunal de Justiça.
Alguns dos juízes-auditores, e não a totalidade, como afirmado no texto, foram, realmente, oficiais da Polícia Militar. Sabem eles, os radicais, que muitos oficiais da milícia bandeirante integram hoje os quadros da Magistratura e do Ministério Público paulista. Serve o fato para demonstrar a capacidade, a competência e o conhecimento jurídico daqueles oficiais.
Ainda na mesma abordagem, afirmam que ocorreu a prescrição relativamente aos delitos de lesões corporais leves cometidos contra 86 detentos, durante o lamentável episódio do Carandiru. Essa afirmação é feita, creio, por informação equivocada que provavelmente lhes tenha sido fornecida. Não posso acreditar que a tenham feito por maldade, apenas para criar dificuldades perante a opinião pública.
Qualquer profissional do direito, mesmo o de mediana cultura jurídica, sabe que para a prescrição em abstrato, isto é, sem julgamento, deve ser levado em conta o máximo da pena prevista para o crime. No caso das lesões corporais leves, aquele máximo é de um ano. ``In casu" a prescrição ocorre em quatro, a contar do recebimento da denúncia. Havendo os réus sido denunciados em março de 93, a prescrição da ação penal só ocorrerá no mesmo mês de 97.
Além disso, diz-se a certa altura que os promotores de Justiça sofrem pressões no exercício de suas atividades. Não se pode aceitar a afirmação de que os magistrados da Justiça Militar manietem e restrinjam o trabalho desses dignos representantes ``Parquet". É tão absurda e descabida, que me permito desconhecer.
Com referência à propalada impunidade dos policiais militares, ela inexiste, tanto no campo disciplinar quanto no penal. Em São Paulo, o Comando da Polícia Militar excluiu 1.365 policiais militares de 1991 a 1994, conforme relatório apresentado.
Na parte penal, o diretor do presídio militar ``Romão Gomes" informou terem passado, no mesmo período, por esse estabelecimento penitenciário, 630 policiais militares em razão de terem sido presos em flagrante, ou presos preventivamente, ou, ainda, condenados, não incluídos aí os crimes propriamente militares.
Por último, a retirada da competência da Justiça Militar para julgar os policiais militares constituir-se-ia, como é afirmado no citado artigo, num degrau para que se atinja o objetivo da desmilitarização da Polícia Militar, visando chegar-se a uma polícia treinada democraticamente, ou seja aquela em que seus componentes poderão filiar-se a centrais sindicais e encetar movimentos grevistas, deixando a população jogada à sua própria sorte. Isso não interessa à sociedade brasileira, apenas aos adeptos do ``quanto pior, melhor".
Senhores radicais, fiquem com suas idéias e deixem a nação trabalhar em paz. Por favor, mudem o disco... o disco... o disco... o disco...

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