São Paulo, domingo, 4 de junho de 1995 |
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Secretaria é simples produtora de eventos
ELVIS CESAR BONASSA
O número seria espantoso, se fosse acompanhado de investimentos em atividades permanentes, capazes de criar e manter centros de formação e produção cultural. Não é o que acontece, apesar de a secretaria possuir um orçamento de R$ 76 milhões, contra apenas R$ 35 milhões de sua similar estadual. O que conta é a quantidade. No saco do milhar de eventos entram indiscriminadamente performances de rua e shows no vale do Anhangabaú, parque Ibirapuera e parque do Carmo. Ou oficinas, como na Freguesia do Ó, em maio, para confecção de cartas para o Dia das Mães, com colagens e dobraduras. Um dos critérios dessa política cultural a mil por mês é a visibilidade. Os grandes eventos em espaços públicos atraem bastante gente e ganham espaço na imprensa. Os pequenos eventos atraem pouco público mas não custam quase nada e engordam as estatísticas mirabolantes da área cultural. O prefeito Paulo Maluf reclama com o secretário Konder sempre que o nome da Prefeitura de São Paulo não aparece nas reportagens feitas por TVs e jornais sobre os eventos da secretaria. Para Maluf, cultura é antes de tudo marketing. O empenho na imagem é acompanhado pelo abandono das estruturas da área. Na reestruturação de carreiras de nível superior municipais, que ordenou cargos e salários, ficaram de fora cultura, esportes e lazer, arquitetos e engenheiros e procuradores. Os procuradores nem precisariam dessa medida. Ganham honorários nas causas em que defendem a prefeitura e não enfrentam problemas salariais. Os arquitetos e engenheiros vão receber um abono mensal de R$ 700. Para cultura, esportes e lazer, o abono será de apenas R$ 250. O salário inicial de um bibliotecário, por exemplo, está hoje em R$ 431 por oito horas diárias. No final da carreira, atinge R$ 900. Ganham pouco e não têm condições de trabalho. Na biblioteca Afonso de Taunay, na Mooca, uma das 65 que compõem a rede municipal, há apenas três bibliotecários que atendem até 400 pessoas por dia. Os livros estão se deteriorando. Embora haja um funcionário treinado em restauração, a prefeitura não fornece material. As 13 casas de cultura estão com problemas similares. Na Casa de Cultura de Itaquera, só cem pessoas estão matriculadas nas oficinas culturais promovidas lá. A casa fica ao lado no conjunto habitacional Cohab 2/3 (Itaquera, zona leste), com 250 mil habitantes. ``Nós precisamos colocar dinheiro do próprio bolso em algumas atividades. Nem máquina de xerox nós temos", relata o agente cultural João Luiz de Brito. Para dar seu curso sobre cinema, ele mesmo vai atrás de filmes e fitas de vídeo. A prefeitura não paga eventual custo de aluguel. As apresentações semanais de teatro foram abandonadas. Desde o início do ano, houve apenas três. Para este mês, está programada uma pouco cultural festa junina. ``É triste", afirma Brito. A cultura de quermesse patrocinada pela prefeitura é temperada com erudição oferecida como lazer. O parque do Ibirapuera é palco de apresentações de balé e música clássica aos domingos. No Teatro Municipal se concentra a chamada alta cultura. Atrações internacionais, como o tenor Jose Carreras, se apresentam lá. Mas a falta de critérios claros de programação no Municipal foi reconhecida até pelo próprio governo, que substituiu na semana passada a diretora do Departamento de Teatros, Isabel Sobral. A Casa do Bandeirante, no Butantã (zona oeste) forneceu na tarde de sexta-feira uma imagem simbólica. Restaurada, a casa estava vazia. Não tem acervo próprio, apenas abriga exposições. Do lado de fora, um grupo de pessoas jogava futebol usando a fachada histórica como gol. Texto Anterior: Pitta nega desvio para obras Próximo Texto: `Democratizei a cultura' Índice |
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