São Paulo, domingo, 4 de junho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para fazer a hora

EDSON VAZ MUSA

É bem melhor entrar logo no jogo do que tentar impor regras para participar
Entre idas e vindas, o Brasil desperdiçou tempo e enterrou oportunidades na busca de uma fórmula para o seu desenvolvimento. Mesmo com alterações na dosagem, a tentativa de utilizar os mesmos ingredientes -forte presença do Estado na economia, desestímulo ao capital estrangeiro, barreiras à importação e penalização à exportação de alguns setores- deu no que deu: alternância de períodos de recessão e de crescimento, de abertura e fechamento. Incubava-se a inflação a golpes de pacote e ela renascia mais forte e predadora.
Hoje, o país tem a oportunidade de fazer a sua hora. A fórmula tão intensamente buscada, e que está sendo aplicada com sucesso em várias partes do mundo, exige a substituição de conceitos que ficaram velhos por outros: abertura econômica, integração comercial, redução da presença do Estado na economia e liberdade para investir e produzir.
É fácil falar, mas difícil fazer? Vejamos: nos últimos 20 anos, os países asiáticos saíram de uma posição marginal para ganhar o primeiro plano no cenário econômico. Com taxas de crescimento recordes de 89 a 93, o PIB de Cingapura cresceu, em média, 8,1% ao ano; o da Coréia do Sul, 6,9%; Indonésia, 6,8%; e Taiwan, 6,5%.
Esses e outros países simplesmente roubaram a cena de outras nações, como Brasil e México, antes apontadas como importantes pólos de atração de investimentos. Tanto que economistas, políticos e jornalistas se referem aos próximos anos como o "Século do Pacífico.
A dinâmica da economia asiática realmente surpreende. Um estudo do "IMF World Economic Outlook estima um crescimento médio superior a 7% na economia da Ásia nos próximos quatro anos, enquanto os países industrializados manterão taxas em torno de 3% e países do Ocidente algo próximo a 4,5%.
A própria China, um país politicamente fechado, está se modernizando e abrindo sua economia. Com um setor privado que já pode ser considerado forte, a China é um dos campeões em crescimento econômico. A taxa média de crescimento do PIB chinês de 89 a 93 alcançou 8,5%. Não é sem razão que a China é séria candidata a se converter em um dos maiores poderes econômicos do mundo no próximo século.
E, para quem ainda vê o processo de globalização econômica como uma conspiração do capital internacional para manter países periféricos na pobreza, basta verificar alguns indicadores sociais da Ásia.
Em duas décadas, a população abaixo da linha de pobreza na Indonésia foi reduzida de 60% para menos de 20%. Na Malásia, de 37% para cerca de 15%. Em Cingapura, de 35% para menos de 10%. Esta sim pode ser considerada uma política de distribuição de riqueza, geração de empregos e desenvolvimento social.
A razão desse desempenho, que já consumiu milhares de páginas de estudos acadêmicos, pode ser apresentada de forma simples e objetiva: trabalho duro + impostos baixos + incentivo à poupança + mínimo de governo. Resultado: crescimento econômico.
O embasamento teórico dessa fórmula está na clara visão desenvolvida pelos asiáticos de que o Estado não gera riqueza, mas pode promovê-la ao reduzir a burocracia, incentivar exportações e apoiar, ao invés de controlar, as forças do livre mercado.
Vamos analisar a fórmula brasileira. Com sinal positivo, temos a capacidade de trabalho, um setor industrial bem-estruturado, um grande mercado e, tudo indica, uma economia estabilizada. Com sinal inverso, um governo ainda pesado, impostos elevados e excesso de regulamentação. Consequência: crescimento menor do que o necessário e constante necessidade de ajustes.
É verdade que não há uma receita única para fazer o bolo do crescimento econômico. Mas certos ingredientes não mudam. Na maioria dos países da Ásia, os impostos que incidem sobre empresas e pessoas são bem mais baixos do que no Ocidente, o que leva a investimentos e aumento da poupança interna. A privatização, o livre comércio, o incentivo ao capital estrangeiro e um mínimo de regulamentação são outros ingredientes básicos.
Essa é a receita que o Brasil não deve mais hesitar em usar, cabendo ao governo e ao Congresso Nacional mostrar que o país, enfim, firmou uma visão de futuro. Os projetos enviados ao Congresso e a ação do governo têm essa direção. A maior velocidade no programa de privatização, que caminhava vagarosamente, a quebra de monopólios e o fim de restrições ao capital estrangeiro são passos rumo a um Estado moderno e a uma economia sadia, forte.
Há ainda muito a fazer. A carga fiscal brasileira, por exemplo, lembra um elefante, tal o seu peso sobre pessoas e empresas. É importante, porém, manter o rumo. Como os países asiáticos descobriram há 20 anos, é bem melhor entrar logo no jogo do que tentar impor regras para participar.
Quem fica nessa posição, como o Brasil, dificilmente encontra a oportunidade para comemorar o sucesso de um gol e, muito menos, uma vitória em um cenário de forte competição.

Texto Anterior: Importação questionada ; Modelo paulista ;Quem serve ; Refeição completa ; Quem abastece ; Passando a limpo ; Outra mão ; Mudando a camisa ; Roupa estendida
Próximo Texto: Ajuste dos EUA é decisivo para latinos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.