São Paulo, domingo, 4 de junho de 1995
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Inimigos devem buscar soluções de paz

JIMMY CARTER

Pergunta - Como o senhor seleciona os conflitos nos quais se envolve como mediador?
Resposta - Em primeiro lugar, não duplicamos os esforços bem-sucedidos de outros. Se a ONU, o governo norte-americano ou qualquer outra organização estiver realizando um trabalho efetivo numa região em conflito, nossos serviços não são necessários.
Em segundo, todas as partes envolvidas no conflito precisam concordar com nosso envolvimento.
Em terceiro lugar, eu informo o presidente dos EUA de quaisquer pedidos que eu esteja considerando seriamente e busco sua autorização para empreender uma missão de paz, quando há interesses de política externa norte-americana envolvidos na questão.
É claro que para me envolver em uma missão também preciso acreditar que todas as partes estejam seriamente interessadas na paz e dispostas a fazer concessões capazes de criar uma base para um diálogo e, em última análise, um acordo do qual todos saiam ganhando.
Existem mais de cem conflitos em curso no mundo, hoje. E o Carter Center recebe muito mais solicitações de intervenção ou assistência do que temos condições de aceitar.
Pergunta - O que a sra. Carter anda fazendo atualmente?
Reposta - Rosalynn é minha parceira na maioria de minhas atividades e me acompanha pelo mundo afora em missões humanitárias e de paz.
Mas ela também tem seus programas e projetos próprios. Ela preside a Força-Tarefa de Saúde Mental do Carter Center, um grupo de especialistas que está trabalhando para identificar questões-chave nesse campo.
Nos últimos dez anos ela vem promovendo reuniões anuais entre os chefes das organizações nacionais de saúde mental para ajudar a construir um consenso em torno de questões-chave.
No ano passado, ela trabalhou em conjunto com a ex-primeira-dama Betty Ford para conseguir a inclusão da saúde mental e da dependência de drogas e álcool nas propostas de reforma do sistema de saúde.
Rosalynn também está trabalhando com Betty Bumpers, mulher do ex-senador Dale Bumpers, do Arkansas, em um projeto chamado "Todas as Crianças até os Dois Anos", uma tentativa de conscientizar os pais sobre a necessidade da imunização das crianças. Elas atravessaram o país inteiro para promover medidas que tornem a imunização mais acessível.
Rosalynn também dirige o Instituto Rosalynn Carter do Georgia Southwestern College, que está pesquisando a crise da assistência e as reações a ela.
Com base nesse trabalho, ela recentemente escreveu o livro "Helping Yourself Help Others ("Ajudando-se a Ajudar os Outros" - Times Books, 1994).
Juntos, também construímos casas para o Habitat para a Humanidade, escalamos montanhas em várias partes do mundo, praticamos cooper, pescaria e visitamos nossos nove netos.
Pergunta - Eu li seu livro de poemas, "Always a Reckoning". Qual é seu poeta favorito?
Resposta - Na minha opinião, Dylan Thomas é o maior poeta deste século.
Comecei a me interessar por ele há 40 anos, quando topei com um poema chamado "A Refusal to Mourn the Death, by Fire, of a Child in London" (Uma Recusa em Enlutar-se com a Morte, pelo Fogo, de uma Criança em Londres).
Desde então já li tudo dele ou sobre ele que pude encontrar, e cheguei a fazer meus quatro filhos decorarem seus poemas!
Quando visitei a abadia de Westminster, em Londres, na época em que era presidente, fiquei espantado quando o arcebispo me disse que a abadia não incluiu Dylan Thomas no Canto dos Poetas porque ele era tão "imoral".
Foi um choque para mim, já que alguns dos outros poetas homenageados eram conhecidos por terem tido mau comportamento de diferentes tipos.
Então comecei a escrever cartas ao conselho de diretores e à mulher de Dylan Thomas. Depois de vários anos finalmente colocaram Dylan Thomas em seu devido lugar no Canto dos Poetas.
No meu escritório tenho uma réplica exata da pedra que foi colocada na abadia de Westminster. Ela me foi oferecida pelo povo do País de Gales.
Pergunta - Quais foram os modelos que o sr. procurou seguir, quando era mais jovem?
Resposta - Tive vários. Eu admirava profundamente a ética de trabalho do meu pai e seu sentido de comunidade.
Minha mãe também exerceu forte influência sobre mim. Ela era enfermeira na cidadezinha de Plains, na Geórgia, onde passei minha infância.
Todo mundo a chamava de "Miss Lillian", e ela às vezes provocava controvérsias porque sempre falava com franqueza e fazia o que julgava ser certo, não importando o que os outros dissessem.
Por exemplo, ela dava assistência médica gratuita a nossos vizinhos negros, numa época em que a segregação e o preconceito racial eram norma no sul do país.
Na escola, eu admirava minha professora, Julia Coleman, que me incutiu amor pela literatura e todos os tipos de conhecimento.
Quando ingressei na Marinha, meu ídolo passou a ser o almirante Hyman Rickover, que impunha uma disciplina rígida a seus subordinados e me ensinou a sempre dar o melhor de mim mesmo.

Tradução de Clara Allain

Os leitores podem mandar suas perguntas para: Jimmy Carter, a/c The New York Times Syndicate, 122 E. 42nd Street, 14th Floor, New York, N.Y. Favor incluir nome, cidade e país. Nesta coluna serão respondidas perguntas de interesse geral. As perguntas não publicadas não poderão ser respondidas individualmente.

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