São Paulo, segunda-feira, 5 de junho de 1995
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Não é boa porque...

FRANKLIN DE MATOS

A tradução do ``Essai sur les Éléments de Philosophie" não é boa porque revela conhecimentos precários em francês, em português e em filosofia. Abaixo seguem alguns exemplos (as citações do original francês são feitas de acordo com a edição de Georg Olms, Hildesheim, 1965).
Na pág. 39 do texto brasileiro, ``de la dioptrique de Descartes" (in pág. 58 da edição francesa) é traduzido por ``do Dióptrico de Descartes" (o correto é ``da dióptrica de Descartes"). Obviamente a ``distração" revela completa falta de familiaridade com a filosofia.
Na pág. 21, ``la question tant agitée" (pág. 36) é traduzido por ``a questão tão remexida", solução retomada várias vezes e que dispensa comentários.
Na pág. 19, lê-se: ``Não somente ela abandona à ignorante sutileza dos séculos bárbaros esses objetos imaginários de especulações e disputas, cujas escolas ainda ressoam", etc. Entretanto, o original diz: ``Non seulement elle abandonne à l'ignorante subtilité des siècles barbares ces objets imaginaires de spéculations et de disputes, dont les écoles retentissent encore", etc (pág. 31); ou seja, ao pé da letra e em bom português: as quais as escolas ainda ressoam (ou, numa regência mais usual, as quais ainda ressoam nas escolas).
Referindo-se à ``Enciclopédia", D'Alembert escreve: ``Ce que le public a déjà vu de cet ouvrage fait désirer qu'il ne soit ni opprimé par ses ennemis, ni abandonné ou dégradé par ses auteurs" (pág. 13). Ou seja: ``Aquilo que o público já viu desta obra faz desejar que ela não seja nem oprimida por seus inimigos, nem abandonada ou degradada por seus autores". Mas a tradução brasileira diz na pág. 8: ``O que o público já viu daquela obra faz desejar que não esteja nem oprimido por seus inimigos, nem que seja abandonado ou degradado por seus autores" (pág. 8). Como se vê, a tradutora parece ignorar que ``ouvrage" é um substantivo masculino e, por isso, comete um erro de concordância pueril e grave, que compromete o sentido da frase.
Existem ainda vários outros equívocos do gênero. Em minha resenha achei que deveria advertir o leitor sobre a qualidade duvidosa da tradução, mas não quis aborrecê-lo com erros tão elementares.

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