São Paulo, quinta-feira, 8 de junho de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Anne Teresa de Keersmaeker celebra ritmo
ZECA CAMARGO
Todas as danças que Anne Teresa trouxe ao Brasil (na verdade, um ``pout-pourri" de suas criações) transcendem a classificação de meras coreografias: elas são celebrações do ritmo e do movimento inusitado. Esse é, como sempre, o elemento-chave: o inusitado de ``Kinok" (trilogia que a companhia belga apresenta neste Carlton Dance) traz o frescor de ver algo provocante. Não exatamente irreverente -essa não é a questão. Mas algo que faça você lembrar que a palavra renovação ainda pode fazer sentido. Começa com ``Rosa", um breve trecho de uma coreografia homônima maior. Imaginar essa peça executada por inteiro é um exercício de prazer criativo. Em ângulos desconhecidos do corpo e impulsos que lembram um filme passando ao contrário, um casal dança em êxtase seco. É como se a vontade de vencer o outro tivesse enxugado toda a emoção deles. Mas ela está lá, ainda que disfarçada, nos olhares que não se encontram. E há ainda a descoberta do plano do joelho. A posição, que para muitos significa penitência, aqui vira detalhe de estilo. Um violino ao vivo, cenário simples e deslumbrante, mais a estranhíssima iluminação (que aliás marca todas as peças) completam essa introdução. Mesmo com esse impacto todo, ``Rosa" não te prepara para o que vem em seguida. Explodindo na música de Thierry de Mey (que dá o nome a ``Kinok"), bailarinos vão extrapolando a linguagem de Keersmaeker. São tantos os movimentos inéditos que eles apresentam que o espectador entra em desespero para poder acompanhar todos. Você que sempre acha que os olhos são sempre mais rápidos que qualquer movimento do corpo, prepare-se para uma frustração. O jeito mais fácil de acompanhar esta peça é entregar seus olhos ao acaso. Pode deixar que eles não vão se decepcionar. Aliás, todo esse exercício é mais que recompensado na coreografia seguinte, ``Grosse Fuge". Depois de desafiar seu raciocínio (em ``Rosa") e também sua percepção (em ``Kinok"), Anne Teresa convida agora ao simples prazer de ver sua companhia enlouquecer. São tempos impossíveis, saltos improváveis, pausas inesperadas e corpos em delírio técnico. E nem sempre é a rapidez que surpreende. Um momento só com homens, bem no chão, é (sem trocadilhos), o ponto alto da dança. Ou não, talvez seja o final de ``Grosse Fuge". Ou os momentos em que a bailarina loira de cabelos curtos aparece. Ou a hora em que toda a companhia salta junto. Desculpe, mas não está dando para decidir o que é melhor. O jornalista ZECA CAMARGO viajou ao Rio a convite da organização do festival Espetáculo: Kinok Companhia: Rosas Coreografia: Anne Teresa de Keersmaeker Quando: hoje, 21h Onde: Teatro Sérgio Cardoso (rua Rui Barbosa, 153, tel. 011/288-0136) Texto Anterior: O mestre partilha suas experiências Próximo Texto: Companhia espanhola traz vigor surpreendente Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |