São Paulo, quinta-feira, 8 de junho de 1995
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PFL 2000

OTAVIO FRIAS FILHO

Enquanto o governo se preocupa com o saldo comercial de junho, enquanto a CUT e o PT lutam para sobreviver amanhã, o PFL só pensa no ano 2000. Tudo vai tão às maravilhas para esse partido que a direção nacional, olhos postos no futuro, já divulgou suas teses para a data fatídica.
Afora a banalidade publicitária da marca, o advento do ano 2000 tem um significado muito especial para o PFL. Afinal de contas, não é todo dia que um partido comemora 500 anos de domínio sobre seu país; sempre citado como detentor do recorde, o PRI mexicano mal passa dos 70.
Verdade que no passado recente o PFL foi expulso do poder (político, não social) pelo ditador Getúlio Vargas. Chamava-se então UDN e amargou algumas décadas de ostracismo, desenvolvendo sofisticadas técnicas de golpe de Estado na tentativa de voltar.
A UDN reunia tudo o que houvesse de mais hipócrita e sacripanta na política brasileira. Era formada por fazendeiros-bacharéis que suspiravam pelo liberalismo europeu ou americano, enquanto mantinham suas propriedades em regime semifeudal.
As intenções eram as melhores, na oratória fulgurante de alguns de seus líderes, mas o país não se adequava a elas. Não havia fazendeiros-bacharéis em quantidade suficiente para eleger os candidatos da UDN e o partido foi obrigado, a fim de concretizar aquelas intenções, a seduzir os militares para chegar, com eles, ao poder.
Tentaram em 45, em 55, em 61 e finalmente conseguiram em 64. Exceto pela defecção de uns poucos sonhadores, incapazes de entender como o governo dos liberais poderia ser uma ditadura, ficaram bem instalados até 85, quando pularam para o barco de Tancredo, e deste para o de Sarney, de Collor, de FHC, rumo ao ano 2000.
Tudo isso é mais do que sabido. Mas de alguns anos para cá, uma profunda reviravolta se preparava nos subterrâneos da economia internacional; ao eclodir, entre milhares de consequências igualmente minúsculas, ela mudou o destino da UDN, quer dizer, do PFL.
Os excluídos sempre foram a pedra no sapato do liberalismo, mas eles tinham uma função no complexo jogo da dependência, na lógica do desenvolvimento ``desigual e combinado" entre as nações. Isso acabou. Os excluídos não são mais um estorvo necessário. O futuro dirá se não teria sido mais ``humanitário", como sugeriu Marcelo Coelho num artigo, fuzilá-los simplesmente.
O resultado é que pela primeira vez o PFL se sente em casa dentro do seu próprio país. Os miseráveis, os atrasados, os mestiços continuam sendo maioria, mas agora são eles o corpo estranho, o encrave absurdo, os que além de sem-teto, sem-terra etc. passam a ser também sem-lugar.
FHC sabe disso há muito tempo. É o que explica a sua guinada de 180 graus. Explica também o bem-estar no mundo por parte de ACM, a suavidade da ascensão de seu filho, o desmantelamento do sindicalismo, a consagração exultante de Roberto Campos e por que o PFL, aliás UDN, já abre champanhe pelo admirável ano 2000.

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