São Paulo, segunda-feira, 12 de junho de 1995
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Ministro defende aumento 'moderado' da tributação

JOMAR MORAIS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro da Administração e Reforma do Estado, Luiz Carlos Bresser Pereira, mal sentou na cadeira ministerial, em janeiro passado, e comprou uma briga na qual poucos políticos profissionais ousariam se meter: defendeu o fim da estabilidade no emprego para os servidores públicos e o início de uma reforma que deve tirar das mãos do Estado para a sociedade boa parte dos serviços públicos.
Seis meses depois, com o seu projeto de reforma da administração pública já pronto para entrar em pauta no Congresso, Bresser dispara um novo torpedo.
Em entrevista à Folha, ele afirma que, para tornar visíveis os efeitos da reforma estatal, o governo forçosamente terá de aumentar a carga tributária.
A seguir, os principais trechos da entrevista:

Folha - Quais as consequências da vitória do governo na semana passada, aprovando na Câmara o fim do monopólio da Petrobrás, sobre a sua proposta de reforma do Estado?
Luiz Carlos Bresser Pereira - Depois da vitória do governo na questão do petróleo, é claro que a aprovação das demais propostas de reforma tornou-se mais fácil.
Folha - Mas a pressão corporativa dos funcionários públicos continua muito forte.
Bresser - Algumas pessoas dizem que vai ser muito difícil aprovar esta reforma porque os funcionários públicos são muito poderosos. Não são tão poderosos assim. Seu sindicato não tem grande representatividade e o grande poder deles está no fato de estarem presentes nos corredores do Congresso e também nas famílias dos congressistas.
Folha - Entre deputados e senadores da base do governo -PSDB e PFL principalmente-, acredita-se que o debate da reforma administrativa no Parlamento será cercado de dificuldades, pois atinge interesses diretos de políticos e seus eleitores.
Bresser - A reforma da administração pública interessa a toda a população e afeta diretamente só os interesses dos funcionários, que são apenas 6% da população. É preciso ver, porém, que a parte mais importante dessa mudança não é a alteração da estabilidade do servidor público e sim descentralizar e tornar a administração gerencial na área dos serviços prestados pelo Estado.
Folha - Como assim?
Bresser - Devido ao chamado regime jurídico único, que é um desastre para o país, as autarquias e fundações perderam toda a autonomia, passaram a trabalhar com funcionários públicos estatutários, encareceram seus custos e passaram a operar com bastante ineficiência. A primeira emenda da reforma do Estado, a da descentralização, vai devolver a autonomia a essas entidades e permitir que adotem sistema de administração por objetivos.
Folha - Para isso é preciso mexer na estabilidade dos servidores dessas entidades, não?
Bresser - A segunda emenda da reforma flexibiliza a estabilidade do servidor público e eu penso que isso interessa a todos os brasileiros. Quem paga imposto quer ter direito a um serviço público eficiente e muitos funcionários ineficientes se escondem atrás da estabilidade. A emenda permitirá que se dispensem funcionários não apenas por justa causa, mas também por ineficiência de desempenho ou quando exista excesso de quadros.
Folha - Mas não haverá o risco de demissões políticas?
Bresser - Não. O funcionário dispensado terá direito a ampla defesa, se o motivo for ineficiência de desempenho. Os critérios serão objetivos e serão respeitadas as cláusulas de indenização.
Folha - E como fica a questão dos salários dos servidores?
Bresser - A terceira emenda trata das remunerações dos servidores dos três poderes. Qualquer aumento de salários no âmbito do Executivo, Legislativo ou Judiciário passaria a ser definido em projeto de lei, o que daria margem a uma maior isonomia de salários entre funcionários públicos.
Folha - Das três emendas da reforma, qual a que o sr. considera mais explosiva e difícil de negociar?
Bresser - Não há nada explosivo. Acho que a parte mais importante da reforma é a primeira emenda, que trata da descentralização. A parte mais polêmica é a da estabilidade, isto porque na Constituição de 88 foram concedidos privilégios descabidos aos funcionários, como a aposentadoria de 130% e a estabilidade quase irrestrita. Houve um retrocesso burocrático brutal e sem nenhum debate público, graças a um espécie de acordo silencioso entre esquerda e direita.
Folha - Não há possibilidade desse acordo repetir-se agora?
Bresser - Agora não. Acredito que os parlamentares vão votar de acordo com a orientação vinda da opinião pública e também dos que lhes disserem os governadores e prefeitos.
Folha - Parece que o sr. está muito confiante no apoio dos governadores e prefeitos.
Bresser - A articulação com governadores e prefeitos é completa. O apoio veio espontaneamente, inclusive de governadores da oposição. Fizemos duas reuniões com os secretários estaduais de administração, quando discutimos as emendas. Recebemos contribuições excelentes para o seu aperfeiçoamento. Os prefeitos também têm participado de reuniões comigo. Todos eles sabem que sem reforma administrativa não conseguirão governar.
Folha - Como serão resolvidas efetivamente as questões da estabilidade e do direito de greve dos funcionários públicos?
Bresser - A estabilidade deverá ser mantida nas carreiras exclusivas de Estado, aquelas em que o Estado tem interesse em defender a si próprio, as suas decisões. Por exemplo, fiscais da Receita Federal e da Previdência. Nessas carreiras não haverá direito de greve. Nas demais será mantido o direito de greve, mas não haverá estabilidade rígida.
Folha - Também será discutida a questão tributária paralelamente à da reforma administrativa. O que o sr. pensa a respeito?
Bresser - Eu sempre digo que num projeto de governo social-democrata, como é o do presidente Fernando Henrique Cardoso, é recomendável aumentar moderadamente a carga tributária, que está em torno de 26% e, espero, deve chegar aos 30%. Mas devem aumentar mais que proporcionalmente os serviços sociais e sua qualidade. Por isso é que o aumento da eficiência do aparelho do Estado é fundamental.

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