São Paulo, segunda-feira, 12 de junho de 1995
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Exposição celebra o inventor do livro

ARTHUR NESTROVSKI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando de pensa em livros na Renascença, não há quem não lembre de Gutemberg, o inventor da prensa. Combinada à invenção moderna do papel, a prensa de Gutemberg mudou o rumo da nossa cultura, permitindo a difusão do conhecimento através dos livros.
Há um outro nome, porém, quase tão importante quanto ele, embora menos conhecido: Aldus Manutius (1452-1515), o maior editor veneziano do século 16.
O primeiro livro editado por Aldus foi em 1495. A partir desta data, ele se tornaria renomado como realizador das primeiras edições impressas dos clássicos gregos, no original (o primeiro Aristóteles, entre outros) e como o responsável por alguns dos mais belos livros ilustrados da Renascença.
Autor, também, de gramáticas de grego e latim, além de comentários à poesia de Horácio, Aldus realizou sua inovação mais importante em 1501. Este é o ano do primeiro volume de uma coleção de ``livros portáteis"; isto é, que se pode levar de um lado a outro, livros como são feitos até hoje, e não no formato antigo, de mesa.
Simples como parece, poucas invenções teriam o efeito dos livros portáteis de Aldus. Reunindo ideais humanistas com a nova tecnologia de impressão, Manutius tornava agora o conhecimento acessível a um vasto número de leitores, fora dos limites das instituições de ensino, ou religiosas, e a um custo muito inferior ao dos grandes volumes ornamentados.
Cada ``enchiridion", como ele os chamava, usando um neologismo grego para ``livro de mão", apresentava o texto de um clássico grego ou romano, impresso em tipologia especial, imitando a escrita cursiva dos humanistas italianos. É um tipo que atende até hoje pelo nome de ``itálico". (Muito embora, da língua italiana propriamente, só Dante e Petrarca tiveram a honra de entrar na coleção.)
Tomados em conjunto, estes pequenos volumes são um verdadeiro arauto da era moderna, onde a tecnologia e o pensamento se unem na palavra impressa.
Agora que se completam 500 anos do primeiro livro da gráfica de Manutius, com o característico símbolo de um golfinho em torno a uma âncora, as bibliotecas Morgan, em Nova York, e da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, estão promovendo uma exposição com os principais trabalhos de Aldus. A exposição fica aberta até 28 de julho na biblioteca da UCLA e é complementada por um pequeno catálogo, assinado pelo curador George Fletcher.
Pode-se ver na exposição um exemplar do primeiro livro feito em papel azul, de 1514; clássicos gregos com as características fontes aldinas; um mapa colorido da Gália; a ``Hypnerotomachia Poliphili", de 1499, fantasia crítica atribuída a Francesco Colonna e reconhecida, até hoje, como o mais harmonioso exemplo renascentista das núpcias entre ilustração e tipografia; o inovador Virgílio de 1501, que deu início aos clássicos ``portáteis"; e outros tantos volumes da editora, incluindo exemplares tardios, produzidos pelo filho e, mais tarde, pelo neto do fundador. Encadernações policromadas revestem os esforços do espírito de um luxo veneziano.
Não sei se é preciso falar outras coisas de um homem que virtualmente inventou o livro e desenhou o tipo itálico: seria mais o caso de erigir estátuas de Aldus Manutius em todas as cidades do mundo. Ele é o santo padroeiro dos editores, e um modelo moderno do que pode ser a relação, mutuamente benéfica, entre ambições intelectuais e um projeto empresarial.
Pode-se imaginar o universo sem gatos ou sem concreto armado. Mas não é possível imaginar o mundo -o nosso mundo- sem livros. Mais que de Gutemberg, esta é a galáxia de Manutius.
Valem para ele, especialmente, as palavras do grande crítico inglês do século passado, Walter Pater, comentando a produção da Renascença italiana: ``Ninguém se cansa de estudar essas obras, não só pelos resultados positivos nas coisas do intelecto e da imaginação, e pelas realizações concretas da arte... Mas também pelo seu espírito geral e caráter, pelas qualidades éticas, que atingem aqui sua forma consumada."

ONDE ENCOMENDAR
Encomendas por fax à Pierpoint Morgan Library (001-212-685-474)0. Também distribuído pela University of Washington Press, P. O. Box 50096, Seattle, WA, 98145. Preço: US$ 15, mais frete.

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