São Paulo, quarta-feira, 14 de junho de 1995
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Suposta contestação

JANIO DE FREITAS

Um registro entre parênteses, no artigo “Os tempos que são novos”, inspirou o presidente do Instituto Brasileiro para o Desenvolvimento das Telecomunicações, Oscar Corrêa Júnior, a produzir uma carta de 76 linhas, das quais, lamentavelmente, só 23 referem-se ao que escrevi. Eis o trecho do artigo, cujo tema era a facilidade com que o governo e grupos econômicos podem mudar tudo na Constituição, desde que façam distribuição bem-orientada de dinheiro, cargos e favorecimentos:
“(...) na atividade empresarial, ficará para pesquisas futuras a ação de um suposto Instituto de Desenvolvimento das Telecomunicações, fachada pomposa para um lobby tão endinheirado quanto ordinário”.
Da carta de Oscar Corrêa Júnior: “No que diz respeito à classe empresarial e, especificamente, representando o IBDT, citado no seu artigo como “suposto IDT”, quero informar-lhe que a exemplo da classe trabalhadora, representada nos trabalhos da revisão constitucional pelo lobby do Sintel, Fittel, CUT e outras entidades corporativistas, realizamos trabalho de proselitismo, às claras, em locais públicos, sem medo ou constrangimento na defesa de nossos ideais e princípios.(...)
“Intolerável, porém, é o conceito que a nosso respeito firma, “fachada pomposa para um lobby tão endinheirado quanto ordinário”. Atribuo o ‘endinheirado não à capacidade econômica e financeira dos associados do IBDT, mas, ao resultado do trabalho, esforço e capacidade de seus empresários e de mais de 400 mil empregados (...) Quanto ao ‘ordinário’, só o aceito se estendido, a exemplo do que ensina o “Aurélio”, como o habitual, comum, regular, periódico.”
Agradeço a facilidade com que Oscar Corrêa Júnior avaliza minha definição do IBDT, pois lobby é, por definição, o “trabalho do proselitismo” (palavras dele) motivado por interesses. Mesmo que negasse o aval, porém, não poderia negar os fatos, de que dou um exemplo.
Os jornais noticiaram a indignação com que vários deputados, à frente Nelson Marchezan e Humberto Souto, retiraram-se de uma recepção a que foram convidados pelo deputado Maluly Neto. “Isso não é recepção, é lobismo e eu não admito isso” -bradava Marchezan, tão logo começou o trabalho de lobby pela privatização das telecomunicações. A recepção transformou-se em vexame, no momento e nos jornais de vários dias.
Maluly Neto pagou pelo fiasco, e não imerecidamente. Mas quem montou tudo, usando uma casa da empreiteira Odebrecht, foi Oscar Corrêa Júnior, que não agiu “às claras”, como na carta disse que faz, nem antes nem depois do episódio vergonhoso. Deixou a bomba com o outro.
O lobista Oscar Corrêa Júnior criou o IBDT para “trabalho do proselitismo”, pelos métodos concretos dos lobistas comerciais, para o caso das telecomunicações. Reconheço-lhe a razão, por isso, quando protesta a minha referência ao “suposto Instituto de Desenvolvimento das Telecomunicações”. O correto seria dizer, e o faço agora, suposto Instituto de suposto Desenvolvimento, porque não é instituto, não se ocupa de desenvolvimento do que quer que seja. O que faz é lobby endinheirado e ordinário.
E não foi por outra razão que Oscar Corrêa Júnior insistiu, por intermédio do jornalista e meu amigo Neri Vitor, para um almoço comigo, dispondo-se a viajar ao Rio para isso. Mas preferi que dedicasse esse tempo a algum jornalista ou parlamentar seduzível. Sei que Oscar Corrêa Júnior, com os instrumentos que lhe são reconhecidos, aproveitou esse tempo.

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