São Paulo, quinta-feira, 15 de junho de 1995
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Burton acha `difícil copiar' Ed Wood

Estréia hoje filme sobre `pior diretor do mundo'

AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Tim Burton, 36, é pessoalmente muito menos "dark" que seus filmes. O diretor de "Batman" (1989) e "Eduardo Mãos-de-Tesoura" (1990) esteve em Cannes apresentando dentro da mostra competitiva seu ultracinéfilo "Ed Wood", uma homenagem ao cineasta de filmes baratos eleito no anos 80 como "o pior da história". O filme saiu sem prêmios, mas ficou entre os três favoritos da crítica internacional.
O cinema de animação foi a primeira paixão do cineasta. Seu primeiro emprego foi animando sequências para os estúdios Disney. Seu curta de estréia, um desenho animado chamado "Vincent" (1982), era narrado e dedicado a um dos astros do cinema de terror, Vincent Price.
A admiração de Burton pelo ator levou-o a realizar o documentário ainda inédito "Conversas com Vincent", que está sendo finalizado. Outro mito dos filmes de horror, Bela Lugosi, é figura central em "Ed Wood".
Na entrevista à Folha , Burton explica porque escolheu Ed Wood como personagem e fala das origens de seu sombrio universo cinematográfico. Não quis adiantar nada sobre seu novo projeto, que seria de ficção científica. "Lendo os jornais, às vezes acho que há outro Tim Burton cineasta rodando por aí", disse rindo.
Folha - Por que você escolheu Ed Wood como personagem?
Tim Burton - O primeiro filme dele que eu vi foi "Plan 9 From Outer Space" (1958). Tinha imagens que nunca esqueci. Depois houve sua escolha como "o pior cineasta de todos os tempos". Como alguém pode ser escolhido o pior? Há tantos maus cineastas.
Comecei a ler sobre sua vida e sobre os personagens sinistros que o cercavam, como Bela Lugosi. Wood era sempre positivo, mesmo nas piores circunstâncias. Quando você lê suas cartas, vê que ele achava que estava fazendo grandes filmes, achava que estava fazendo "Cidadão Kane".
Numa carta do fim da sua vida, Wood escreve que teve uma grande vida e fez grandes filmes e na verdade estava totalmente abandonando e morrendo de alcoolismo. É isso que me encanta no personagem. Ele era muito estranho.
Acho que seria fácil copiar uma imagem de Alfred Hitchcock, não com sua maestria, mas poderia imitá-la. Mas copiar uma imagem de Ed Wood é tão difícil. Suas imagens eram muito estranhas. Você não sabe como ele as conseguiu. Wood era algo mais especial do que apenas mau (risos).
Folha - Quão decisivo foi o personagem de Bela Lugosi, já que você celebrara antes outro mito do horror, Vincent Price?
Burton - Vincent foi alguém básico para minha opção por fazer filmes. Havia semelhanças entre eles, mas as diferenças são marcantes. Vincent teve um final muito mais positivo. Bela envelheceu drogando-se com morfina e bebendo formaldeído. Vincent era muito menos amargo com Hollywood.
Folha - O filme inicialmente seria colorido. Por que virou preto e branco?
Burton - Quando fomos fazer um teste de maquiagem com Martin Landau, eu e o maquiador Rick Baker nos perguntamos: quais as cores dos olhos de Bela Lugosi? Eu nunca o vi e ninguém viu imagens coloridas de Lugosi. Ele, Vampira, Thor Johnson, são ícones em preto e branco. Foi uma decisão simples, sem qualquer pretensão "estética". Pareceu o jeito certo.
Folha - Rodar em preto e branco não traz dificuldades em Hollywood hoje?
Burton - É difícil, mesmo se você tem sorte e tem sucesso. É difícil colocar qualquer projeto em andamento. Sempre pensei que iria se tornar mais fácil. Me enganei.
Folha - De onde vem esta obsessão gótica de seus filmes?
Burton - Acho que parte vem como reação ao meio onde nasci. O sul da Califórnia é muito colorido e brilhante e acho que tive que compensar isso. Tento fazer coisas não tão sombrias pois gosto da combinação de escuro e claro, humor e tristeza. Nunca sinto uma delas sozinha, vem sempre juntas.
Folha - Por que você não dirigiu "Batman Forever"?
Burton - Não o recusei, apenas decidi não fazê-lo. Estou marginalmente ligado ao projeto, como produtor executivo. Temi fazê-lo muito depressivo (risos). O que me incomodou em "Batman" foi que havia mais energia em publicidade do que em cinema.
Folha - Como está o documentário sobre Vincent Price?
Burton - Eu produzi e dirigi "Conversas com Vincent". Tenho seus últimos depoimentos filmados. Estou com problemas com o direito dos trechos de filmes.

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