São Paulo, sexta-feira, 16 de junho de 1995
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O deus mercado

CLÓVIS ROSSI

HALIFAX, CANADÁ - ``Deus castiga." Por mais agnóstica que seja a família, é improvável que todo pai ou mãe não tenha usado tal expressão para ameaçar filhos recalcitrantes.
No mundo moderno, o novo deus cheio de ira e castigos é essa entidade igualmente imaterial chamada ``mercados". A ele curvam-se até os poderosos, caso dos chefes de governo do G-7, o clube dos sete países mais ricos do mundo. Parecem incapazes de desafiar qualquer uma das regras de mercado, como se fossem as tábuas da lei.
Não que o mercado seja intrinsecamente diabólico. Diz, por exemplo, o premiê canadense Jean Chrétien:
``O volume, velocidade e alcance dos fluxos atuais de capital trazem riscos assim como recompensas. Podem chocar súbita e brutalmente. Nenhum país está imune".
É uma boa avaliação. Falta extrair a consequência. Qual deveria ser o papel dos governos ante tal diagnóstico? A sabedoria convencional diria que tratariam ao máximo de maximizar as recompensas e minimizar os riscos.
Pena que a sabedoria convencional pareça mercadoria de pouca aceitação entre os governantes deste final de século.
Os líderes do G-7, únicos com força política e econômica suficiente para desenharem medidas que pudessem pôr um mínimo de controle nessa espécie de cassino global em que se transformou o movimento de dinheiro, preferem ser mais cautelosos do que até a cautela recomenda.
Tudo para não afrontar deus mercado. Nem sequer vão propor a adoção do mecanismo da concordata também para países, embora seja uma regra que vale para a iniciativa privada e, portanto, está dentro do jogo de mercado.
``Há real interesse nessa idéia, mas, como se trata de um tema extraordinariamente complexo, será remetido para futuras análises", informou ontem a delegação canadense à cúpula anual do G-7.
Difícil não concordar com Fred Bergsten, diretor do Instituto para a Economia Internacional, quando ele diz que os líderes parecem ``acovardados" diante do maciço fluxo de capital internacional.

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