São Paulo, domingo, 18 de junho de 1995
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Bispo `oficial' ataca política de natalidade

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

O bispo Fu Tieshan, da igreja oficial, acha que o casal deve decidir quantos filhos vai ter. Ao sustentar tal posição, ele entra em conflito com o governo chinês, que implanta uma política de controle da natalidade.
Fu Tieshan, 64, tornou-se bispo de Pequim em 1979, depois de a capital chinesa ficar 15 anos sem ter seu bispo. Ordenou-se padre em Pequim em 1956 e orgulha-se de representar uma ``família de católicos há cinco gerações". (JS)

Folha - Como o sr. explica o crescimento do catolicismo na China?
Fu Tieshan - O nosso Evangelho chegou à China há 700 anos, mas o catolicismo não se expandiu com a facilidade observada, por exemplo, no Brasil.
O problema principal é que o catolicismo foi trazido do Ocidente para o Oriente e não soube se adaptar à cultura chinesa e suas condições específicas.
Mas a situação está melhorando. As pessoas não estão satisfeitas apenas com as recompensas da vida material, também querem riqueza espiritual.
Algumas pessoas se convertem ao catolicismo por motivo de casamento. Também a China se abriu e pessoas que deixam o país, em especial jovens, querem conhecer a religião do local onde vão viver.
Mas ainda assim não estou satisfeito com nosso crescimento.
Folha - O que impede uma expansão mais acelerada?
Fu - Enfrentamos a falta de padres. Se tivéssemos mais padres, nossa crença se espalharia mais rapidamente. Mas trabalhamos para superar esse problema e estou otimista quanto a nossas perspectivas. Muita gente na China desconhece o catolicismo.
Folha - O sr. é favorável à normalização de relações entre China e Vaticano?
Fu - O relacionamento entre China e Vaticano corresponde a um problema complexo. Por quê? Porque o Vaticano mantém relações diplomáticas com a nossa província de Taiwan.
Espero que as relações entre a China e o Vaticano, no plano Estado-Estado, país-país, se normalizem o mais breve possível. Isso pode promover as nossas relações no plano igreja-igreja.
Folha - Mas existe também a questão da nomeação dos bispos, na qual a China não aceita interferência do Vaticano.
Fu - É preciso cooperação nesse campo também. Historicamente, a nomeação de bispos também provou problemas nas relações entre o Vaticano e outros países. A China e o Vaticano devem discutir e resolver o problema. É preciso muita negociação.
Folha - O que o sr. propõe?
Fu - Isso deve ser resolvido pelos diplomatas.
Folha - A ``Igreja do Silêncio" não representa um terceiro obstáculo?
Fu - Na China existe apenas uma Igreja. Mas, como numa família, os irmãos às vezes brigam entre si.
Estamos nos esforçando ao máximo para superarmos a discórdia que nos separa.
Folha - Existem católicos que rejeitam qualquer tipo de diálogo com a chamada ``Igreja Patriótica".
Fu - Esses radicais não são muito numerosos. Eles têm padres que não receberam nenhuma preparação teológica e suas pregações muitas vezes entram em choque com a Bíblia. Por exemplo, eles dizem que ir aqui à igreja é um pecado mortal, uma heresia!
Folha - O sr. apóia a política de controle de natalidade do governo, conhecida como ``um casal, um filho"?
Fu - O casal deve decidir quantos filhos terá. Ele deve decidir de acordo com as condições materiais da família. Por exemplo, se os pais são operários, apenas um filho vai consumir metade da renda familiar. É muito caro educar uma criança. Muitos casais jovens não podem arcar com os custos de dois filhos.
Discuti essa posição com vários bispos na Europa e eles apóiam a idéia de que o casal deve decidir.
Folha - O sr. está satisfeito com o grau de liberdade para os católicos na China?
Fu - O governo chinês tem uma política de liberdade de religião. A Constituição chinesa também proporciona a liberdade de religião e várias medidas do governo protegem a Igreja. Mas em certas ocasiões é difícil implementar a política para religião formulada pelo governo federal.
Veja, no Brasil, você não precisa se preocupar, porque a população sabe quem foi Jesus Cristo e o que é catolicismo. Mas, aqui, várias autoridades regionais ou municipais não sabem o que é catolicismo. Por isso precisamos gastar muitas palavras para convencê-los a ajudar a Igreja.

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