São Paulo, quarta-feira, 21 de junho de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Imparcialidade é ilusão?
GILBERTO DIMENSTEIN BRASÍLIA - Estou recebendo cartas de alunos de jornalismo perguntando se a busca da imparcialidade não é uma ilusão. Motivo da pergunta: citação que fiz nesta coluna sobre a decisão da Folha em acabar com o duplo emprego, pratica comum nas redações, provocando um doloroso debate sobre isenção.É a discussão mais importante sobre jornalismo. Minha resposta: é mesmo uma ilusão. Mas o profissional deve se comportar como se não fosse uma ilusão. Detalhe, não me considero exemplo e tenho uma coleção de erros com os quais tento aprender. O indivíduo é resultado de sua formação, de seu tempo, de sua família, de suas experiências, crenças, religião, dos conceitos e preconceitos de seu tempo, dos livros que leu, dos filmes que assistiu. Portanto, é um ser essencialmente subjetivo. Por exemplo: como sou judeu, dificilmente conseguiria encarar a questão do anti-semitismo com isenção. Também não é fácil, admito, ver com imparcialidade o conflito entre israelenses e palestinos. Como sou brasileiro, também não é fácil analisar o conflito com a Argentina. Mas a obrigação do jornalista é, pelo menos, tentar entender os dois lados. Há situações, porém, que dificultam ainda mais a busca da objetividade. Por exemplo: ter uma vinculação de emprego com o setores público ou privado fora do jornal e, ao mesmo tempo, fazer sua cobertura. É a mesma coisa com partidos; difícil ser filiado a um partido e fazer sua cobertura. Há uma teia de compromissos que afetam a busca da isenção. Vamos a um caso concreto. Suponha-se que o jornalista preste serviço ao Banco Bamerindus. Certamente, não será a pessoa ideal, embora honesta, a fazer comentários sobre o desempenho de seu dono, José Eduardo de Andrade Vieira, como ministro da Agricultura. Esse indivíduo, aliás, corre o perigo de acabar por elogiá-lo. O elogio pode até ser correto, mas sempre será suspeito. Daí eu achar que, apesar de doloroso, aquele debate sobre o duplo emprego foi vital para o avanço ético da imprensa -um debate que, óbvio, prossegue todos os dias. Texto Anterior: A guerra do filé mignon Próximo Texto: Não vale o escrito Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |