São Paulo, sábado, 24 de junho de 1995
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Espaço para inovações

EUNICE R. DURHAM

Uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional deve ser isto que o nome indica: um estatuto que estabeleça diretrizes e bases permanentes, abrindo espaço para as inovações, as adaptações e as transformações constantes que o sistema educacional exige.
Isso é tão mais importante hoje porquanto, no mundo todo, a educação vem passando por transformações profundas de alcance imprevisível.
A lei não deve procurar resolver os problemas atuais da educação -deve abrir espaço para uma permanente construção coletiva e compartilhada que caracteriza um regime democrático. Ao satisfazer, numa lei permanente, problemas do momento, muitas vezes se impede uma solução melhor para o futuro.
O projeto da LDB da Câmara, assim como o substitutivo Cid Sabóia, estão profundamente marcados por visões e reivindicações dos setores organizados ligados à educação. Não só isso torna a lei demasiado detalhista, descendo, por exemplo, às minúcias de como realizar o processo de avaliação das universidades, mas tende também a torná-la utópica. Todos queriam assegurar, na lei, o maior número possível de benefícios.
Os setores envolvidos com a educação infantil procuraram tornar o atendimento a essa faixa etária praticamente universal. Índios e indigenistas propuseram um maravilhoso sistema de educação indígena. Pais de excepcionais obrigaram o Poder Público a um atendimento integral.
Procurou-se também garantir na lei a universalização do 2º grau, a oferta de formação profissional para todos. Defendeu-se também a obrigatoriedade da educação artística e da educação física, impossível de ser atendida.
Sociólogos e filósofos conseguiram que sociologia e filosofia se tornassem obrigatórias. Educação ambiental, educação para o trânsito também foram consideradas essenciais.
Docentes e servidores das universidades reivindicaram (e obtiveram) a segurança de que terão todos os recursos necessários. São todas aspirações nobres. E se fosse possível teríamos um sistema educacional tão bom quanto o da Suíça, da Noruega e dos EUA.
Resta saber como obedecer à lei se hoje mal estamos conseguindo alfabetizar as crianças e dar um conhecimento mínimo das quatro operações; se os salários dos docentes estão aviltados; se não há professores qualificados e os alunos estão se formando sem terem aulas de física, química e matemática; se a maioria das crianças não termina a oitava série. Fico pensando na professora leiga da escola rural do interior do Nordeste oferecendo aos alunos educação física e artística, educação para o trânsito, e sonhando com a magnífica carreira que a lei criou no papel.
Uma lei deve sinalizar o caminho para uma educação de qualidade, que seja oferecida em estabelecimentos públicos e gratuitos, que atinja a totalidade da população. Esse é um objetivo a ser alcançado por meio de um esforço sério e responsável, não uma garantia a ser estabelecida hoje.

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