São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 1995
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Agricultura de improviso

Há casos em que produtores rurais desviam os recursos da política agrícola para aplicações financeiras. Mas é inegável, por outro lado, a necessidade de apoiar a produção de alimentos e impedir que juros escorchantes quebrem um setor fundamental da economia.
Entre as chantagens da bancada ruralista e a insensibilidade tecnocrática do governo, a discussão agrícola ficou no pior dos mundos. Em relação aos deputados, a defesa da agricultura acabou identificada a um modo espúrio de proceder. Do lado do governo, a política custará R$ 2,8 bilhões sem que esses subsídios tenham resultado de um programa claro e estruturado.
No fim, a sociedade, a quem interessa tanto o zelo pelos recursos públicos como o progresso da agricultura, viu a política do setor surgir de um embate em que nenhum lado parecia agir segundo uma visão ampla dos interesses do país.
Em 1991, durante seu primeiro mandato, o líder da bancada ruralista, Nelson Marquezelli (PTB-SP), apresentou um projeto que vinculava as verbas dos programas federais de alimentação à inclusão de suco de laranja na merenda escolar e no cardápio dos quartéis. Quando confrontado com o fato de ele mesmo possuir 11 fazendas com 184 mil pés de laranja, o deputado respondeu candidamente: ``Todo mundo legisla em causa própria".
Ao praticamente ignorar a forte defasagem entre os preços agrícolas e o custo dos juros, o governo arriscava descapitalizar o setor e reduzir o plantio da próxima safra. E uma oferta menor de alimentos pressiona diretamente a inflação.
Tanto o mau exemplo de Marquezelli -e de vários outros membros da bancada ruralista- como a falta de política por parte do governo são procedimentos lamentáveis. A discussão quanto aos melhores meios de estimular a agricultura merece um tratamento mais sério. Quanto ao que já foi definido para este ano, resta esperar que o governo fiscalize a aplicação dos recursos, que os R$ 2,8 bilhões sejam de fato destinados à lavoura.

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