São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 1995
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Real, câmbio e juro

ANTONIO DELFIM NETTO

O governo comemora -e com razão- um ano de sucesso extraordinário no combate à inflação. A idéia de construir uma moeda indexada para pôr em fase todos os preços relativos e estabilizar a distribuição de renda foi brilhante e bem executada pelo ilustre ex-ministro Rubens Ricupero, que pagou caro pelos bons serviços que prestou à nação.
Como num passe de mágica, a inflação anual caiu de 13.000% para 30%, sem nenhum custo social visível. Pelo contrário. Graças à apropriação, pelos trabalhadores, de parte do velho imposto inflacionário e do aparecimento simultâneo de um sistema de crédito capilarizado, o nível de renda, a produção, o emprego e o consumo se expandiram, invertendo as expectativas pessimistas dos brasileiros.
É verdade que nenhum dos problemas fundamentais foi resolvido. Mas não é menos verdade que o Brasil caminha na direção de resolvê-los, com as reformas constitucionais, com a flexibilização do mercado de trabalho, com a eliminação da indexação, com a abertura (agora claudicante) da economia, com as possibilidades de privatização, com a consciência de que temos de reduzir o ``custo Brasil" etc.
Mas há um problema grave mal resolvido. É o do câmbio. A recente mudança da banda mostrou que o Banco Central vai aprendendo como operá-la. A introdução do leilão com ofertas simultâneas de compra e venda é um aperfeiçoamento interessante, porque poderá dar uma maior visibilidade ao mercado e permitir ao Banco Central funcionar como uma espécie de leiloeiro walrasiano (quem tem um grande estoque de mercadoria!), sem ter que usar a ``mão de gato" do Banco do Brasil. Mas é muito duvidoso que um sistema em que o leiloeiro põe ou tira mercadoria com intervenções intramarginais e os fundamentais não estão satisfeitos possa, de fato, ser chamado de ``bandas".
O problema -como temos dito desde julho de 1994- é que os estrategistas erraram na avaliação do nível de câmbio real de equilíbrio: 1) esqueceram que as exportações só aparentemente apresentavam resultados brilhantes, pois nosso ``share" no mercado mundial é declinante. E que uma parte pelo menos dessas exportações era devida ao baixo nível de atividade interna; 2) esqueceram que, com a redução tarifária e a ampliação do nível de atividade, as importações deveriam crescer dramaticamente.
Dessa forma, era evidente que a utilização da sobrevalorização cambial deveria ser feita com o maior cuidado. Em outras palavras, não havia condições de acomodar a sobrevalorização exagerada sem risco para o equilíbrio sustentado do balanço em conta corrente.
A banda superada não tinha a menor credibilidade. E a nova vai revelar o mesmo fato em pouco tempo. Por que ninguém disse ao sr. presidente que ele não pode pedir coisas impossíveis? A banda do câmbio estabelece, também, a banda do juro. Supondo que a expectativa do mercado seja de uma taxa de câmbio de R$ 0,95 em quatro ou cinco semanas, que o risco Brasil seja de 3,5% ao ano e a taxa de juro externa seja de 6% a 7% ao ano, a taxa de juro interna deve permanecer em torno de 4% ao mês, ainda que o presidente não queira. A alegria da banca já é certa. A dos portadores, duvidosa.

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