São Paulo, quarta-feira, 5 de julho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Charge irrita embaixador

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

Depois da guerra dos carros, Brasil e Argentina entram na guerra da charge.
Tudo começou quinta-feira passada, quando o jornal especializado ``Ámbito Financiero", de cerca de 135 mil exemplares diários, publicou charge em que um negro brasileiro aparece defecando automóveis.
Era uma alusão à disputa entre os dois países em torno da importação/exportação de veículos.
O embaixador brasileiro em Buenos Aires, Marcos Castrioto de Azambuja, mandou no mesmo dia fax de protesto ao jornal.
``Não reclamo pela cor do personagem que representaria o brasileiro nessa caricatura. Qualquer cor nos cai bem, posto que temos contingentes numerosos de todas. Não abrimos mão de nenhuma", diz a carta.
E acrescenta: ``O que me ofendeu foi a tentativa do estereótipo racial, para não falar da grosseria do gesto."
Azambuja ainda ensaiou uma pitada de sutileza, ao dizer que ``argentinos e brasileiros produzem automóveis com seus braços e cérebros".
No dia seguinte, ``Ámbito" voltou ao ataque, com uma charge em que aparece um gaúcho, estereótipo do argentino, defecando carros japoneses.
É uma alusão ao fato de que a fábrica japonesa Toyota decidiu instalar na Argentina e não no Brasil uma montadora de picapes, com investimento de US$ 150 mil.
Não satisfeito, ontem o jornal respondeu ao fax do embaixador com uma carta de seu advogado, Carlos Serres, em que insinua tentativa de censura à mídia pelo embaixador brasileiro.
``Que o Brasil defecou nos autos argentinos é uma verdade. Que o humorista o expresse com total realismo é uma tradição, na imprensa de todos os países, desses profissionais", diz a carta.
Serres admite que o desenho ``não é dos mais finos", mas argumenta que tampouco ``é uma imoralidade tão extrema para obrigar-nos a cair em algo mais grave como a autocensura".
Por fim, pergunta: ``Por que temos que representar o Brasil com um branco e de maneira alguma com um homem de cor? E se se ofendesse Pelé? Ou não é também Brasil?"
Além da carta, o jornal retornou ao tema em texto de primeira página, anteontem.
Diz: ``Se o embaixador do Brasil se irritou por sentir-se representado por um homem de cor, o racista é ele. Ou não?"

Texto Anterior: Cavallo diz que Brasil vai retirar cota para Argentina
Próximo Texto: Tesouro acumula déficit de R$ 1,2 bi
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.