São Paulo, quinta-feira, 6 de julho de 1995
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Córdoba possui monumento à intolerância

MARCELO REZENDE
DO ENVIADO ESPECIAL À ANDALUZIA

Nos finais de semana, no centro histórico da cidade de Córdoba, dezenas de turistas se aglomeram com suas máquinas fotográficas e caminham em silêncio, ao lado de um guia que lhes explica a ``mesquita-catedral da cidade".
Ela é um grande monumento, em uma terra tão repleta deles como a Espanha, à intolerância.
Um dos maiores legados arquitetônicos erguido pelos povos árabes, a mesquita-catedral possui 24 mil m2, o que faz com que os andaluzes a qualifiquem, orgulhosos, de a maior mesquita do mundo muçulmano. O que, a rigor, é uma inverdade.
Não por seu tamanho, ou grandeza de qualquer espécie. Mas pelo fato de que não é mais uma mesquita. Os muçulmanos não podem mais rezar no lugar, já que todo o prédio foi convertido em um templo católico, quando os cristãos tomaram a cidade.
Sua história se inicia entre os anos de 780 e 785, quando Abderraman 1º deu início à construção da mesquita. No mesmo solo onde, antes, havia a basílica de San Vicente.
Várias ampliações ocorreram no prédio ao longo dos séculos, quando os cristãos espanhóis tomaram conta do local.
Mas, no lugar de derrubar todo o prédio, preferiram tomá-lo quase como uma referência e alteraram parte de sua arquitetura interna, para construir várias capelas em seu interior.
Toda a construção guarda uma verdadeira confusão de estilos, passando do gótico ao barroco em apenas poucos metros. Mas a mesquita guarda ainda um pouco do que foi o seu estilo original.
Ao caminhar por seu interior, o turista quase se esquece de que se trata de um prédio erguido em adoração a um deus, ou a dois deles, e o que resta é um apanhando de um momento de embate, onde a ideologia se misturou, de forma brutal, à religião.
Mas Córdoba não é só a cidade da mesquita, ou das ruínas do tempo em que o único império que dominava o mundo era o romano.
É também a cidade de um pintor -um acaso feliz da Andaluzia como certos homens aproveitaram a luz do lugar- conhecido por pintar a cidade de Córdoba apenas para os cidadãos de Córdoba: Júlio Romero de Torres (1874-1930).
Em retribuição a essa fidelidade, a cidade instalou em sua casa o museu Júlio Romero Torres, localizado próximo à igreja de São Francisco, que exibe uma coleção de suas obras.
Ao contrário de Picasso, a obra de Torres é voltada, quase que em essência, aos temas folclóricos, sem aspiração à vanguarda.
Olhar as imagens de Torres é então uma maneira de perceber Córdoba e seus personagens, tomados pelo sono em lugares ensolarados.
Aos jovens do lugar resta o orgulho de a cidade ser o berço de uma das mais populares bandas de rock da Espanha: o Medina Azahara, batizado em homenagem às ruínas de uma cidade árabe, mais uma atração turística local.
O grupo mistura o rock pesado, música flamenca e ainda sons que aprenderam de músicos marroquinos. Um pouco como todo o resto da cultura andaluza, exemplificada pela cidade de Córdoba.

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