São Paulo, quarta-feira, 12 de julho de 1995
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Os olhos no horizonte, as mãos no timão

SÉRGIO A. REZE

Poucos setores no Brasil puderam comprovar, de forma tão marcante quanto o setor automotivo, o acerto de se rotular os anos 80 de ``a década perdida": em 1979 o país produziu 1,08 milhão de veículos, enquanto em 1991, mais de dez anos depois, foram fabricados apenas 916 mil unidades.
Para reverter esse quadro, os agentes que compõem o setor automotivo uniram esforços com o governo federal e os governos estaduais e conseguiram estruturar e implementar um plano de ação que lhes permitiu arrancar o setor do estado de debilidade em que se encontrava.
E o revigoramento do mercado interno que resultou dessa ação conjunta foi tão forte que, hoje, o país detém uma posição estratégica no cenário automotivo internacional.
Já ocupando o oitavo lugar entre os produtores de veículos e possuidor de um dos poucos mercados do planeta com grande potencial de expansão, o Brasil acha-se em condições de formular estratégias para ampliar sua importância no contexto mundial.
O governo está atento a essa nova situação: não foi por outro motivo que, por meio da recente medida provisória nº 1.024/95, procurou traçar as linhas gerais para uma política industrial que tende a fortalecer a produção nacional, a propiciar fortes investimentos e a prestigiar o comércio internacional.
Contudo, é importante que não se perca de vista o papel fundamental desempenhado pelos importadores e distribuidores não-ligados às montadoras nacionais, como elemento de equilíbrio junto ao mercado interno pelos referenciais que proporcionam, sejam tecnológicos, sejam de preços -que, com a volta da alíquota do Imposto de Importação a percentuais mais toleráveis, esperamos que sirvam de freio e parâmetro para eventuais tentativas de se aproveitar de um melhor momento de mercado.
Dada a devida atenção a esse aspecto, há que se elogiar não só a percepção governamental, como também as próprias medidas que, inclusive, criam um ambiente propício para que montadoras de fora venham instalar-se aqui.
Mas, o que não se deve esquecer, em momento algum, é que esta posição privilegiada foi decorrência direta e imediata do fortalecimento do mercado interno. Há três anos, não haveria condições de chamar a atenção das indústrias estrangeiras porque o mercado brasileiro apresentava-se pouco atraente e com visíveis dificuldades de crescimento.
A situação inverteu-se com os esforços realizados na câmara setorial automotiva: a partir do segundo semestre do ano passado, atingimos um patamar interno de 150 mil unidades por mês de vendas a varejo. Há que se reconhecer nesse patamar a condição de equilíbrio, em que não há pressão de demanda nem desestímulo à cadeia produtiva.
Esse volume representa um atrativo inegável para as prospecções das montadoras de fora. Não significa dizer que tenham elas interesse exclusivamente no potencial doméstico do país, mas, sem a menor dúvida, esse é o elemento estratégico mais relevante para suas decisões.
Entretanto, neste momento em que o Brasil começa a definir sua política para atração de investimentos nessa área, as redes de distribuição de veículos têm encontrado imensa dificuldade para manter o patamar de vendas, devido principalmente à falta de mecanismos de financiamento, suspensos a partir do início deste ano, quando se vislumbravam possibilidades de crescimento excessivo na demanda.
Hoje, dissipado por completo esse quadro, o mercado automotivo apresenta nítida retração e é preciso que se flexibilizem linhas de crédito para o setor. Afinal, se o país pretende ter um plano de longo curso, como o demonstra a recente medida provisória nº 1.024/95, é necessário que não se descuide do grande motivador da atenção internacional que o Brasil tem despertado: o mercado interno em crescimento.

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